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Política e Sociedade
Fritando Lula
Orlando Fedeli
Ontem fui assistir o debate sobre “reforma política”, promovida pela Associação Comercial de São Paulo, com o deputado Roberto Jefferson.O auditório estava cheio. O público ansioso por receber o novo oráculo da República. Auditório que compreendia que o debate era pretexto para se ouvirem as palavras que indicariam o que se fará, e o que, provavelmente, vai acontecer nesta conturbada República.
Entrou Jefferson.
Muitos aplausos, quando um valor mais alto se alevanta.
Não lhe faltaram elogios. Todos reconheceram seu valor, por ter corajosamente aberto o ventre do monstro da “Corrupção”, arrancando dele e pondo à mostra o câncer que corrói a República.
Como sempre, aliás.
Como se reconheceu ao dizer que democracia e dinheiro vivem juntos. Que sem dinheiro a democracia não funciona: “Não há Democracia sem dinheiro”, clamou Jefferson.
Ninguém contestou.
Admitiu-se como provado.
Portanto, como dinheiro atrai corrupção...
Jefferson era como um novo São Jorge, salvador da donzela Democracia, enfiando sua rija lança no monstro da Corrupção, que a ameaçava, na razão direta das ganâncias, e na razão inversa ao quadrado da despretensão.
Como sempre.
Roberto Jefferson, -- eu já o vira ao debater com o “veracíssimo” José Dirceu -- deu-me, então, a impressão de uma cobra atenta, aguardando o inimigo, a fim de lhe dar o bote.
Deu.
E acertou.
Atento. Inteligente. Olhar feroz. Sorrindo de satisfação vitoriosa, ao ironizar o inimigo e provocar risos gerais no auditório.
Lembrei-me de Robespierre que caiu, quando se conseguiu romper o terror que ele infundia, com o riso. O riso, essa arma terrível que derruba tiranos, falsos ídolos e pseudo profetas.
Roberto Jefferson tem voz de leão e gestos delicados. É irônico e coloquial.
Mas o que mais impressiona é a segurança e força com que fala.
Fala sem temer o passado (apesar dos quatro milhões recebidos e confessados).
Está seguro do futuro.
Domina o presente.
É claro que o debate de ontem, no Hotel Jaraguá, foi apenas o pretexto para que ele passasse adiante a palavra que ele ouvira, e que devia transmitir como orientação.
E o assunto central era Lula.
Zés Dirceus e cúmplices são já figuras destroçadas. A questão agora é o Lula. Como diria o próprio Presidente: “Nóis somo a bola da veis”.
Já no último depoimento de Jefferson na CPI do Mensalão, em que ele compareceu como acusado, mas em que só falou como acusador, ele dava a impressão de vitorioso. O vencedor do PT. Poucos se atrevendo a enfrentá-lo. Muitos a elogiá-lo. Quase todos a admirá-lo. Todos a temê-lo.
Temor de um novo Robespierre que se alevanta?...
Pois da crise pode nascer um novo carismático salvador da República...
E salvadores da República são sempre perigosos...
Dizia eu, que no depoimento de Roberto Jefferson na CPI do Mensalão, bem tarde da noite, no cansaço geral, já no apagar das luzes da atenção, um deputado o interrogou, dizendo-lhe que não compreendia como ele insistia em dizer que Lula era inocente e de que nada sabia, e que não tinha culpa em todo o esquema da corrupção. Que era impossível Lula não saber o que estava acontecendo a seu lado, promovido por seus auxiliares diretos, que nada faziam sem lhe dizer o que faziam. E que de tudo se deduzia que Lula sabia, e que era o grande culpado por toda a corrupção do governo e do PT.
Jefferson respondeu: “Isso é o senhor que deduz. Eu não. Eu acredito que o Presidente não é culpado. Uma vez, quando o Zé Dirceu me disse que nós vamos mandar a Portugal um emissário para a Portugal Telecom, me perguntei quem era o “nós”. Seriam Dirceu e Lula? Pensando bem, conclui que eram Dirceu e Delúbio. Lula era inocente." (Cito as palavras dele de memória).
O interlocutor insistiu que isso era ilógico, e que Lula devia saber de tudo. Jefferson, sibilino, disse então: "Eu dei as pistas... Cabe aos senhores segurem-nas, investigarem e provarem..."
Era uma insinuação de que havia a possibilidade de Lula ser o grande “capo” do mensalão. “Il capo di tutti i capi”. O poderoso chefão.
Ontem, no debate organizado pela Associação Comercial, no Hotel Jaraguá, Jefferson defendeu Lula de novo. Mas de modo ainda mais tênue. A muralha de palavras duras, fortes e firmes com que ele defendia, antes, a inocência de Lula, se tornou um...véu diáfano.
Admitiu a possibilidade de haver impeachment. Garantiu: “A Democracia não vai acabar”, se houver o impeachment. Que se podia fazê-lo, sem abalar os alicerces das instituições democráticas, que, no Brasil atual, seriam suficientemente sólidas para agüentar o baque.
Mas, admitir o baque, era já admitir o impeachment de Lula. Era aceitar, pelo menos em tese, a culpa de Lula.
O ar condicionado do salão não funcionava bem.
Fiquei com a impressão de que, na cozinha do Hotel, se estava fritando lula “à doré”, tal o cheiro que se espalhou pelo auditório mal ventilado.
Jefferson sugeriu ainda, como solução para a crise, a convocação de uma Constituinte!!!
Uma Constituinte!!!
E sem a dissolução do atual Congresso, que continuaria a legislar e a governar.
E nem acenou o que seria então do Executivo enquanto houvesse a tal Constituinte. Nem acenou o que se faria com o Lula!
E o “Pudê”? Ficava com quem, o “Pudê”?, perguntaria o Sarney.
Continuaria Lula lá?
E a panela do PT, ia para onde?
Na cozinha do Hotel, a lula continuava lá. Na panela.
O cheiro de lula frita a fogo lento, na panela do Hotel, aumentou.
A ventilação do auditório do Hotel Jaraguá estava mesmo muito ruim.
Jefferson deu ainda uma informação muito clara e objetiva: a corrupção do PT não enriqueceu seriamente os petistas. A “Land Rover” do Silvinho Pereira foi uma miserável migalha, se comparada com a imensa massa dos milhões que foram manipulados. A corrupção não era para ir aos bolsos petistas. Era para preparar a instauração do Reino Socialista de Deus na terra, como diriam o ex frei Boff e o semi frei Betto, que é especialista em camarões e lulas.
Na noite de segunda-feira, nesta semana em que se comemora o XI de Agosto, Roberto Jefferson foi à Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, onde se gestaram tantos movimentos purificadores dos ares republicanos.
“Quando se sente bater no peito heróica pancada...”
Não estive lá.
Relato o que me contaram alguns alunos que lá estavam assistindo à fala de Roberto Jefferson.
Desta vez o véu ficou tão diáfano que se rasgou.
Pela primeira vez o “Big Jeff” admitiu que Lula foi culpado, pelo menos por omissão. E quando a moçada das Arcadas começou a gritar em coro: ”Fora Lula!” “Fora Lula!”, Roberto Jefferson profetizou: “Se vocês levarem esse grito à rua, ninguém segura vocês”. “Se houver manifestações nas ruas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cai. Hoje a situação dele é tênue. Se vocês levarem às ruas esse grito, ele não se segura. Não segura".
Noutras palavras, “deixem a folha dobrada”...
Tu o dissestes.
De um daqueles botecos das cercanias do Largo de São Francisco vinha um forte cheiro de lula frita.
São Paulo, nas vésperas do 11 de Agosto de 2005,
Orlando Fedeli.
PS: Justo no mês de Agosto! Tão a gosto da República nacional...OF
Para citar este texto:
"Fritando Lula"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/politica/fritando_lula/
Online, 21/11/2024 às 08:32:59h