O Papa

A rendição do sedevacantismo à realidade e sua profunda incoerência
Alberto Zucchi

Desde criança ouvi meu pai repetir: “a realidade é como a cortiça na água, por mais que você empurre para baixo, ela sempre volta à tona”. Lembrei-me imediatamente deste ditado quando ouvi um áudio que me foi enviado durante esta semana. A seguir explico.

Um dos documentos mais utilizados pelos sedevacantistas para justificar sua posição é a bula do Papa Paulo IV de 1559 “CUM EX APOSTOLATUS” – sobre as autoridades heréticas. Como anuncia o próprio título da bula, não são apenas as autoridades eclesiásticas, mas toda e qualquer autoridade estaria sujeita a suas condenações.

Os sedevacantistas argumentam que, de acordo com a Bula, alguém que fosse eleito Papa tendo caído previamente em heresia, em qualquer momento de sua vida, teria sua eleição inválida. Simples assim.

Já comentamos anteriormente no vídeo “Então vocês aceitam Bergolio? - Respondendo Comentários” (https://www.youtube.com/watch?v=f6kBoURiN9k) que esta Bula claramente não é uma definição de fé, que ela foi revogada pelo Código de Direito Canônico de São Pio X e que, na prática, nunca teve aplicação... e felizmente! Porque ela colocaria perpetuamente em dúvida se a eleição de um papa foi válida e nunca haveria certeza de que o governo da Igreja é legitimo.

Como dissemos, porém, o alcance da Bula não se limita ao clero, senão vejamos:

“E queremos e decretamos que todos aqueles que até agora tenham sido encontrados, ou tenham confessado, ou sejam convictos de terem se desviado da Fé Católica, ou de haverem incorrido em alguma heresia ou cisma, ou de terem suscitado ou cometido (... )”

As condenações da Bula também se aplicam às autoridades civis determinando que sejam privadas do seu governo caso tenham cometido qualquer heresia:

“E do mesmo modo serão privados completamente, e em cada caso, de seus condados, baronias, marquesado, ducado, reino e império, e de forma perpétua, e de modo absoluto. E por outro lado sendo de todo contrários e incapacitados para tais funções, serão tidos ademais como relapsos e exonerados em tudo e para tudo, inclusive se antes houvessem abjurado publicamente em juízo tais heresias. E não poderão ser restituídos, repostos, reintegrados ou reabilitados, em nenhum momento, à primeira dignidade que tiveram...”

Portanto, ao considerarem os sedevacantistas tal Bula vigente, não somente deveriam crer que o Papa, Cardeais, bispos e todo o clero estariam privados de suas dignidades eclesiásticas devido a seus erros doutrinários - o que obrigaria a todos os católicos a não os reconheceram como legítimos pastores, sob pena de estar colaborando com hereges e incorrendo com isso nas mesmas penas - mas isto também deveria ser igualmente aplicado às autoridades civis inclusive o Presidente da República.

Entretanto, recentemente, Diogo, o sedevacantista responsável pelo site Controvérsia Caótica, mais caótica do que nunca, divulgou um áudio no qual defende ardorosamente o presidente Bolsonaro na sua campanha de reeleição. Diz ele que todo o esforço e todo o apoio devem ser dados ao presidente Bolsonaro, porque sua derrota implicará em uma tragédia.

Vejamos o que ele afirma:

“É necessário neste mês lutar muito com oração e com propaganda e com todos os meios possíveis para que não aconteça que a desgraça desse homem [Lula] de haver uma mudança e uma revolução no governo porque se os comunistas vencerem vai ser uma verdadeira desgraça para este país isto daqui nunca mais vai ser a mesma coisa... vai ser uma catástrofe nacional.”

No início da mensagem Diogo se mostrara inconformado com o resultado apresentado pelo TSE a favor de Lula, em Santa Catarina onde ele reside... (Olhem a coincidência! Santa Catarina de Siena era uma mulher que ensinava - o que Diogo condena para todas as mulheres - e que criticava cardeais e o Papa - sem deixar de reconhecer sua autoridade!)

Ora, com esta defesa do presidente Bolsonaro, Diogo cai novamente no erro que ele mesmo condena, visto que os sedevancantistas, ao defenderem que a Bula de Paulo IV possui uma autoridade infalível que obriga a todos os católicos, deveriam concluir que não se pode apoiar e votar em Bolsonaro, pois ele claramente já caiu nas condenações fulminadas na Bula - basta lembrar que Bolsonaro foi “rebatizado” por pastores protestantes no rio Jordão em Israel. Sendo assim, os sedevacantistas deveriam considerar que o presidente e candidato à reeleição é um relapso e deve ser exonerado de todas as suas funções, não podendo ser resposto.

Mais uma vez, o sedevacantismo, que já havia sido vencido no debate doutrinário e mostrado suas contradições quando quis se auto promover aparecendo ao lado de dom Athanasius, foi vencido pelo bom senso e pela realidade. A cortiça na água, empurrada para baixo acabou voltando à tona.

Será que, diante de tanta contradição, as muitas pessoas que foram envolvidas pelo encanto da serpente do sedevacantismo não acordarão e voltarão atrás? Rezemos para que Nossa Senhora lhes dê a humildade suficiente para reconhecer seu engano, porque diante de tanta incoerência, o erro do sedevacantismo tornou-se patente!

Alberto Luiz Zucchi

10/10/2022


    Para citar este texto:
"A rendição do sedevacantismo à realidade e sua profunda incoerência"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/papa/incoerencia/
Online, 25/11/2024 às 06:14:40h