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Olavo de Carvalho: católico ou astrólogo?
“Os corpos celestes de nenhum modo são causa dos atos humanos” (São João Damasceno)
É muito comum encontrar católicos esperançosos com a retórica direitista, sobretudo daqueles que, posando de filósofos, proclamam-se católicos tradicionalistas. Não são poucos os discípulos ou simples admiradores desses pregadores de uma “mídia sem máscara”. Sabe-se que até mesmo clérigos tidos por conservadores manifestam confiança e bajulações, como se o combate ao marxismo bastasse como selo de ortodoxia.
Embora extremamente relevante, não discutiremos neste artigo a questão anti-esquerdista nos discursos de Olavo de Carvalho. A priori, reafirmamos apenas nossa convicção histórica de que, na luta contra Deus e a Igreja, direita e esquerda são irmãs gêmeas dialéticas. Apoiar a direita é, de algum modo, apoiar a esquerda marxistóide. Basta ler as páginas da história com os dois olhos para constatar a aliança conspiratória entre liberais e comunistas.
A intenção presente é demonstrar a versão esotérica, e portanto não católica, do astrólogo Olavo de Carvalho. Para esse fim, reproduziremos suas próprias afirmações, contrapondo-as com a verdadeira doutrina católica. Faz-se necessário este trabalho, sobretudo, neste momento em que por inesperados apoios clericais poderiam levar alguns católicos a atribuir alguma ortodoxia a Olavo.
Em sua obra “Astros e Símbolos”, Olavo não descarta por completo as previsões astrológicas. No máximo, condena apenas uma ênfase excessiva, que culminaria no estabelecimento de uma nova astrologia:
"A noção de que as pessoas tenham um destino estampado nos céus e de que o pré- conhecimento desse destino possa ser levar a um ‘aperfeiçoamento’ individual não é em si mesma totalmente falsa, mas uma ênfase excessiva neste modo de ver as coisas misturadas a concepções fantasistas sobre o karma, das quais falarei mais adiante - pode levar a uma extinção de toda religiosidade autêntica e ao estabelecimento de uma nova astrolatria" (Olavo de Carvalho. Astros e Símbolos. Editora: Nova Stella, 1985, p. 77).
Noutro trecho, Olavo relaciona astrologia com teologia, além de rechaçar o conhecimento acadêmico:
"Essas observações preliminares fornecem ao leitor, desde já, um critério seguro para saber se está falando com um conhecedor do assunto ou com um charlatão, ignorante e falsário (envernizado ou não das tinturas acadêmicas): o astrólogo de raça há de saber, por um lado, enunciar os princípios metafísicos, cosmológicos e teológicos em que se fundam as regras astrológicas que aplica, e, por outro, converter essas regras nos seus eqüivalentes gramaticais, lógicos, estéticos, etc."
Para ocultar o germe esotérico de sua astrologia espiritualista e anti-científica, Olavo apresenta o ensino de Santo Tomás sobre a questão, pretendendo identificar a teologia católica com a magia astrológica:
"Segundo São Tomás, os astros não influem em nosso entendimento, mas sim no nosso aparato corpóreo; se, portanto, agem sobre nosso psiquismo, não é a título de causas essenciais, mas de causas acidentais" (Olavo de Carvalho, Astros e Símbolos, p. 63).
Realmente, neste ponto a doutrina exposta por Olavo concorda com o pensamento de Santo Tomás. Porém, é oportuno frisar que, embora os astros possam influir em nosso aparato corpóreo, Santo Tomás nega que eles possam exercem influência sobre as potências intelectiva e volitiva da alma, determinando nossas escolhas ou ações na história.
Antes de expor os trechosem que Olavoafirma sua crença esotérica, faremos a explicitação da “doutrina angélica” quanto à influência dos astros nas decisões humanas.
Na Suma Teológica, Santo Tomás é contundente:
“O supor, pois, que os corpos celestes são causa dos atos humanos, é algo próprio dos que dizem que o entendimento não se distingue dos sentidos [...] Mas, como é absolutamente certo que o entendimento e a vontade não são faculdades dependentes dos órgãos corpóreos, não é possível que os corpos celestes sejam causas dos atos humanos” (Parte I, Q. 115, art. 4).
Pela inquestionável autoridade do Santo Doutor, não citaremos todo o conteúdo de sua brilhante refutação filosófica. Ademais, a precisão terminológica e a lógica tomista dispensam um tratado sobre o assunto.
Escrevendo contra os Gentios, Santo Tomás demonstra as conseqüências aberrantes e heréticas da astrologia:
“Seria, ademais, inútil o estabelecimento das leis e dos preceitos do viver se o homem não fosse senhor das suas eleições. Também inúteis seriam as penalidades aos maus e os prêmios aos bons, se não estivesse em nosso poder escolher isto ou aquilo. Faltando, no entanto, tais coisas, desapareceria a vida social, imediatamente. Logo, segundo a ordem da providência divina o homem não foi de tal modo constituído que as suas eleições sejam provenientes dos corpos celestes” (Livro III, Capítulo LXXXV).
No livro “Comentário aos Mandamentos”, o Aquinate conclui afirmando ser pecado o preceito dos astrólogos:
“Contra este precepto pecan los astrólogos, que dicen que los astros gobiernan a las almas; siendo que, al contrario, fueron hechos para el hombre, cuyo único soberano es Dios” (Santo Tomás de Aquino. Comentario a los Mandamentos).
Eis o pensamento puríssimo de Santo Tomás.
Resta saber se a crença do Olavo concorda com a Teologia Católica.
Se naquele primeiro trecho Olavo reafirmou a doutrina católica, mais adiante ele deixou escapar os primeiros elementos de sua “devoção” astrológica:
"Se, enquanto corpos, os planetas só atuam sobre corpos, podemos completar o raciocínio de São Tomás dizendo que, enquanto símbolos, ao contrário, eles representam ou veiculam a atuação de potências espirituais e cósmicas que ultrapassam infinitamente os domínios do corpóreo. Neste caso, não são os planetas que agem, mas sim as potências angélicas das quais eles são somente a cristalização simbólica e sensível, por assim dizer" (Olavo de Carvalho, Astros e Símbolos, p. 47).
Além da absurda pretensão de completar o pensamento de São Tomás, Olavo de Carvalho afirma que os corpos planetários são cristalizações e veículos de potências angélicas que ultrapassam o domínio corpóreo.
E Olavo não apenas ousa “complementar” a “Doutrina Angélica”, como também a distorce vergonhosamente, pretendendo incluir Santo Tomás na lista dos astrólogos “olavianos”:
"Ao contrário do que geralmente se pensa, a astrologia, enquanto estudo das relações entre os movimentos planetários e eventos terrestres e humanos, nunca foi propriamente ‘condenada’ pela igreja, como aliás se vê pelas longas e belas páginas que São Tomás de Aquino, na Suma contra os Gentios, dedicou à explicação das influências dos astros como veículos das potências angélicas" (Olavo de Carvalho, Astros e Símbolos, p. 80).
Olavo fala do que não sabe!
Como já demonstrado, a Teologia Católica considera pecaminosa a crença que supõe uma conexão de causa e efeito entre os movimentos planetários e os eventos humanos. Para certificar-se, basta reler os textos de Santo Tomás. A Igreja sempre condenou a astrologia. É o que provaremos a seguir.
Logo de início podemos citar a Didaqué ou Catecismo dos Apóstolos:
“[...] Também não pratique encantamentos, astrologia ou purificações, nem queira ver ou ouvir sobre essas coisas, pois de todas essas coisas provém à idolatria” (Didaqué, ed. Paulus, 1989, p. 12-13)
Os Padres da Igreja também foram unânimes na condenação da astrologia:
Hipólito: “Quão impotente é o sistema [astrológico] para comparar as formas de disposições dos homens com os nomes das estrelas!” (Refutação de Todas Heresias 4:37).
Santo Atanásio: “Donde ser verdade que os autores de tais livros [os astrólogos] acarretaram a si próprios uma dupla reprovação, pois aprofundaram-se em uma desprezível e mentirosa ciência” (Carta de Páscoa 39:1).
São Basílio Magno: “Aqueles que ultrapassam os limites, fazendo das palavras da Escritura sua apologética para a arte de calcular temas de genitura [horóscopos], pretendem que nossa vida dependa da moção dos corpos celestes, e assim os Caldeus lêem nos planetas o que nos ocorrerá”. (Os 6 dias da Criação 6:5)
São João Crisóstomo: “(…) E de fato uma treva profunda oprime o mundo. É ela que devemos fazer dissipar e dissolver. E tal treva não se encontra somente entre os heréticos e os gregos, mas também na multidão do nosso lado, no que diz respeito às doutrinas da vida. Pois muitos [os Católicos] descrêem inteiramente na ressurreição; muitas fortificam-se com o horóscopo; muitos aderem a práticas supersticiosas, augúrios e presságios”. (Homilias sobre Coríntios I, 4:11)”.
Santo Agostinho: “O bom cristão deve precaver-se de astrólogos ou de qualquer um daqueles que praticam impiamente a adivinhação” (apud Sto. Tomás, II-II, Q. 95, art. 5).
A condenação prosseguiu ininterruptamente, até culminar no infalível anátema:
“Se alguém pensa que se deve crer na astrologia, seja anátema” (DENZINGER, nº 35).
“Se alguém crê que as almas humanas estão ligadas a um signo fatal (v. 1.: que as almas e corpos humanos estão ligados a estrelas fatais), como disseram os pagãos e Prisciliano, seja anátema” (DENZINGER, nº 239).
A Igreja, portanto, excomunga os adeptos da astrologia.
No caso de Olavo, não seremos nós a decretar sua excomunhão. Queremos apenas provar que ele defende uma doutrina infalivelmente anatematizada pela Igreja Católica. Para tanto, reproduziremos dois trechos suficientes para ressaltar sua “fé” em uma doutrina herética:
Em um artigo, Olavo afirmou que os ciclos históricos são influenciados pelos astros:
"A astrologia tem, sobre a ciência histórica corrente, justamente a vantagem de permitir um estudo mais amplo, pois o modelo dos ciclos planetários pode articular, numa moldura única e coerente, as várias correntes de causas - econômicas, políticas, culturais, etc. - que contribuem para a elaboração da história: onde o historiador comum se perde ante a variedade dos fatores, o astrólogo (ou o historiador versado em astrologia) elabora rapidamente uma síntese viva e dinâmica do conjunto" (Olavo de Carvalho. A Década de 80. Com que Direito estão Prevendo o Fim do Mundo? in Planeta, Dezembro de 1979, no 87 p.40).
Nota-se que ele atribui uma vantagem da astrologia em relação à ciência histórica. Para Olavo, a astrologia proporciona ao historiador um estudo mais amplo acerca das causas econômicas, políticas e culturais. Sendo assim, todo historiador deveria ser, acima de tudo, um bom astrólogo para conhecer as verdadeiras causas que determinam os fatos históricos. Logo, segundo esta concepção absurda, existiria uma ligação direta e determinante entre os astros e os acontecimentos humanos.
Abandonando a "explicação" marxista da História, Olavo adotou uma "explicação" astrológica-gnóstica.
No mesmo artigo, ele também escreveu:
"As grandes transições ocorridas sob o signo de Escorpião parecem evidenciar sempre o desgosto das potências cósmicas, que regem o destino humano, contra qualquer forma de equilíbrio estático que ameace eternizar um determinado status (...) "(Olavo de Carvalho, artigo A Década de 80..., Planeta, Dezembro de 1979, no 87, p. 42. O negrito é meu).
Novamente Olavo afirma que o destino humano é regido pelos astros.
O que é isso se não a mais pura astrologia gnóstica?
E não venham os pupilos alegarem uma suposta mudança de pensamento nos escritos desse astrólogo de internet. Seus artigos mais recentes provam que sua “fé” astral permanece inalterada. Citaremos, pois, fragmentos de um artigo publicado em 04 de maio de 2012, no qual afirma: “reproduzo em apêndice dois escritos meus já antigos, mas bem divulgados na época, nos quais resumo minhas opiniões, até hoje inalteradas em essência, sobre a questão astrológica”.
Não convencido pela Teologia de Santo Tomás e tampouco pelo anátema infalível da Igreja, Olavo insiste na possibilidade de haver uma relação entre o movimento dos astros e o desenrolar da vida humana:
“No entanto, os debates, na sua quase totalidade, têm se limitado aos aspectos mais vistosos e periféricos da questão astrológica, sem fazerem avançar um passo sequer o esforço para responder às perguntas que constituem, ou deveriam constituir, o miolo do problema: existe, objetivamente, uma relação entre os movimentos dos astros no céu e o desenrolar da vida humana na Terra? Se existe, qual a sua natureza e o seu alcance? Quais as causas que a determinam? Quais as possibilidade e os meios de conhecê-la cientificamente?”
Responder a essas questões é, para Olavo, de máxima importância para a nossa civilização:
“No entanto, a questão das influências astrais, em si, e independentemente da polêmica, é da máxima importância para a nossa civilização em seu estágio presente”.
Além de persistir apaixonadamente numa questão já resolvida pela Igreja, Olavo de Carvalho também hostiliza aqueles que, confiando na doutrina católica, rechaçam de imediato a astrologia como inexistente, falsa e herética:
“A astrologia é um amálgama enorme e confuso de códigos simbólicos, mitos e preceitos empíricos, procedentes de épocas e civilizações diversas, numa variedade que se rebela contra toda tentativa de reduzi-la a um corpo unitário de doutrina. Como pronuciar-nos, de um só golpe, sobre a veracidade ou falsidade de uma massa tão heteróclita? Só a ignorância fanática ou o desejo de aparecer explicam que alguém se disponha a tomar partido num debate que se coloque nesse termos”
E diz mais:
“Se a astrologia tal como se praticou e se prática hoje é falsa, o que temos de fazer é uma verdadeira, ao invés de proclamar, com uma autoconfiança de avestruz, a inexistência do fenômeno astral sob a alegação de falsidade do que dele se diz”.
Considerando que a Igreja Católica anatematizou com um só golpe toda e qualquer crença ou prática astrológica, Olavo, consciente ou não, acusa a Igreja de ignorante e fanática, motivada por uma autoconfiança de avestruz.
E nem adianta dizer que a astrologia formalmente condenada difere da astrologia olaviana. A Igreja, sempre que condena um erro, não deixa outra possibilidade senão a renúncia total a esse erro. Assim, quando a Igreja condenou o socialismo, ela não possibilitou um socialismo cristão. Do mesmo modo que não poderá jamais existir um socialismo cristão, também não poderá existir nunca uma astrologia católica.
E como prova de que Olavo não se arrepende de suas práticas astrológicas, transcrevo sua própria confissão:
“Como prova de que sou um “astrólogo embusteiro”, o sr. Rodrigo Constantino reproduz no seu blog uma reportagem da Veja, datada de 9 de abril de 1980, na qual, desafiado pelo repórter Luiz Henrique Fruet, analiso o mapa astrológico de uma pessoa desconhecida e, em resultado, forneço um perfil integralmente correto do indivíduo, sem um erro ou imprecisão sequer, e com detalhes que nenhuma especulação divinatória poderia jamais alcançar. Veja deu o braço a torcer”.
Diante de tal declaração, não resta dúvidas de que Olavo não reproduz e até se opõe ao que ensina a doutrina católica.
A doutrina de Olavo é herética!
E como ordena São Paulo: “Foge do Herege” (Tito, III, 10-11).
In Corde Jesus, semper Eder Silva
Para citar este texto:
"Olavo de Carvalho: católico ou astrólogo?"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/igreja/olavo-de-carvalho-catolico-ou-astrologo/
Online, 21/12/2024 às 14:34:24h