Igreja

Campanha da Fraternidade 2021: fraternidade com o erro, inimizade com Deus
André Roncolato
Recebi de um amigo, um pequeno vídeo de um tal Leonardo Lucian Dall Osto, que de fato não conhecia. No seu facebook ele não se identifica por completo, mas parece ser padre do clero de Caxias do Sul. Padre Dall Osto cursou ou cursa a Lateranese e não disfarça o anel de tucum, símbolo conspícuo da Teologia da Libertação. Em resumo, vê-se que é um padre que está investindo em sua carreira na Igreja. Que graça para os fiéis de Caixas do Sul ter um padre assim estudando em Roma ao invés de estar exercendo seu sacerdócio na Diocese.

O pequeno vídeo embalado com ares de alta teologia na realidade apenas desfoca os graves problemas que existem na campanha da Fraternidade ano, 2021. Padre Dall Osto – sabida ou ingenuamente – categoriza as objeções levantadas contra a CF2021 promovida pela CNBB e pretensamente responde a elas.

Segundo o Padre, a origem dessas objeções estaria no fundamentalismo religioso, uma ideologia portanto, que o padre em seu pequeno vídeo, não tem o trabalho de conceituar. Do ponto de vista doutrinário o padre coloca a causa das objeções em uma visão teológica platônica da Fé Católica, contrária a uma teologia “semita” - o que isso quer dizer? - e “bíblica”.

Sistematizamos a argumentação do Padre Dall Osto em defesa da CF 2021 no quadro a seguir. Na primeira coluna estão as críticas que são dirigidas a campanha, na segunda as consequências doutrinárias que estas críticas produzem, e na terceira o que seria um correto posicionamento dos católicos, tudo é claro, segundo o Padre Dall Osto.

Críticas

Consequências

Soluções

Pauta esquerdista (LGBT, Feminismo, Desigualdade Social, Racismo, etc)

Uso da Religião com um mal perfeito, pois teria uma justificativa absoluta para perseguir os que pesam diferente

Questão social. São também nossos irmão e irmãs.

Crítica ao ecumenismo

Contra o C. Vaticano II. Fica fora da “caminhada” da Igreja Católica

Toda religião tem verdades em vários níveis e graus que devem ser consideradas positivamente pelos católicos.

Salvação Individual

Fé intimista. Desprezo da matéria. Cai inevitavelmente no docetismo e nestorianismo duas heresias dos primeiros séculos

Só existe conversão individual se houver “conversão” social

No decorrer deste artigo mostraremos como é equivocado o pensamento do Padre, sobretudo se o analisarmos a luz da doutrina católica e do ensinamento magisterial da Igreja.

Tendo como base um claro pensamento modernista e agindo como um inquisidor moderno, padre Dall Osto excomunga, ou seja, decreta que está fora da Igreja quem tem um pensamento diferente do dele.

Apesar da voz tranquila é indisfarçável o ódio do Padre aos opositores da CF, a tal ponto que ao final do vídeo, ele faz uma pressão moral, acusando de soberba, aqueles que tem a ousadia de não concordar com as decisões colegiadas da CNBB. E acrescenta que, se opor ao Concílio Vaticano II é se opor ao Espírito Santo, o que até pode ser considerado um pecado sem perdão.

Assim, Padre Dall Osto, substituindo o papa e a autoridade da Igreja, decreta por ele mesmo, que a pena por se opor ao Concílio Vaticano II é a excomunhão.

Não se pode deixar de ver a contradição. Minutos antes no vídeo, o padre defendeu o diálogo e a fraternidade com os hereges, infiéis e pecadores públicos, para logo em seguida, conclamar a aplicação da severidade e rigor da lei da Igreja aos católicos que só estão cansados dos escândalos doutrinários diariamente perpetrados pelo clero. Que hipocrisia, Padre!

No vídeo Padre Dall Osto destaca um ponto importante com o qual estamos de acordo: os princípios nos quais se baseiam a CF 2021 tiveram origem no Concílio Vaticano II.

A pergunta fundamental que se coloca então é a seguinte: aqueles que se opõem a qualquer ensinamento do Vaticano II estão fora da Igreja? É claro que não, vejamos rapidamente alguns argumentos

O concílio Vaticano II não foi um concílio infalível e nem dogmático, porque assim quis o próprio Concílio. A afirmação é de Paulo VI, e consta do pronunciamento feito pelo papa no encerramento do Concílio:

“Mas convém notar uma coisa: o magistério da Igreja, embora não tenha querido pronunciar-se com sentenças dogmáticas extraordinárias sobre nenhum capítulo doutrinal, propôs, todavia, o seu ensinamento autorizado acerca de muitas questões que hoje comprometem a consciência e a actividade do homem.”

http://www.vatican.va/content/paul-vi/pt/speeches/1965/documents/hf_p-vi_spe_19651207_epilogo-concilio.html

Portanto, não se pode negar que, de si mesmo, o concílio gozou de uma grande autoridade, mas também não se pode negar que esta autoridade não foi infalível e, portanto, discordar de algum ensinamento do concílio não implica “a priori” em exclusão da Igreja. Se o padre Dall Osto tivesse razão ao afirmar que o concílio é infalível ele deveria afirmar que Paulo VI também caiu em heresia ao negar tal característica do concílio. Parece que quem não leu os textos do Concílio foi o padre Dall Osto, ou leu dando a interpretação que ele quer.

É ainda necessário lembrar que em um conjunto tão grande como os dos textos conciliares cada documento tem um peso diferente e por isto exige do católico um assentimento diferente. Assim o documento Unitatis Redintegratio citado pelo Padre Dall Osto é um decreto, que em si mesmo tem menos valor que as Constituições promulgadas pelo Vaticano II. Mas ressaltamos: em nenhum destes documentos o Concílio quis se manifestar de forma infalível.

Cabe notar ainda que Padre Dall Osto em seu vídeo não citou textos do concílio, mas sim deu a sua interpretação, assim a infalibilidade estaria no padre e não no concílio. Atitude esta bem modernista.

E não querendo se expressar de forma dogmática, o concílio procurou utilizar uma linguagem coloquial. Quem afirma isto é novamente Paulo VI

“[O Concílio] exprimiu-se no modo hoje usado na conversação corrente, em que o recurso à experiência da vida e o emprego dos sentimentos cordiais dão mais força para atrair e para convencer.”

Ora, exprimir-se de um modo coloquial e não técnico produz inevitavelmente um texto com várias interpretações. Por isto existem muito questionamentos sobre as ambiguidades do texto conciliar, fruto de sua própria redação fenomenológica e mais grave ainda, das inúmeras interpretações, por vezes antitéticas do próprio concílio feitas pelos teólogos modernos, as quais são atribuídas ao chamado espírito do concílio.

O Papa Bento XVI em discurso à cúria, trata disso abertamente, mas o Pio Brasileiro, tão pouco aberto ao Papa Bento XVI, parece não ter tomado conhecimento desse pronunciamento papal.

“Os problemas da recepção [do Vaticano II] nasceram do fato que duas hermenêuticas contrárias se acharam em confronto e discutiram entre si. Uma causou confusão, a outra, silenciosamente, mas sempre mais visivelmente, trouxe e traz frutos”. (Bento XVI, Discurso à Cúria, em 22 de Dezembro de 2.005)

O Papa João Paulo II, foi mais longe e afirma que no Concílio Vaticano II há uma síntese entre o cristianismo e o iluminismo, o que equivale dizer, sua doutrina é questionável posto que o iluminismo é explicitamente anticatólico e anticlerical:

“Nos documentos do Vaticano II, pode-se encontrar uma sugestiva síntese da relação entre o cristianismo e o Iluminismo” (João Paulo II, Memória e Identidade, Edit. Objetiva, Rio de Janeiro, 2.005, p. 126).

Definir que os católicos que tenham qualquer restrição ao Concílio Vaticano II estariam automaticamente excluídos da Igreja tendo como base a recente declaração do Papa Francisco, é para dizer no mínimo muito precipitado.

A afirmação do Papa foi feita de uma forma improvisada, atitude esta muito usual pelo Papa Francisco, o que deixa espaço para a imprecisão.

Na verdade, há muitas nuances em “aceitar o concílio”. O quer dizer isso? Aceitar que ele foi legitimamente convocado? Ou aceitar tudo que nele foi proposto sem nenhuma diferença de acepção? Ou aceitar como infalível e dogmático aquilo que o Concílio assim não definiu? Devemos aceitar o que o CV II está em contradição com os Concílios e magistério anteriores? Estas e outras perguntas podem ser feitas e precisariam ser respondidas antes de se lançar uma sentença de excomunhão para aqueles que fazem qualquer crítica ao Vaticano II. Veja-se o que o Card. Ratzinger, atual Bento XVI, afirma a este respeito:

"Doutra parte, é possível e até necessário criticar os pronunciamentos do papa, se não estiverem suficientemente baseados na Escritura e no Credo, ou seja, na fé da Igreja universal. Onde não houver, nem a unanimidade da Igreja universal, nem o claro testemunho das fontes, não pode também haver uma definição que obrigue a crer. Faltando as condições, poder-se-á também suspeitar da legitimidade [de um pronunciamento papal]." (Joseph Ratzinger, Das Neue Volk Gottes - Enwürfe zur Ekkleseologie, Düsseldorf: Patmos-Verlag, 1969, trad. br. por Clemente Raphael Mahl: O Novo Povo de Deus, São Paulo: Paulinas, 1974, p. 140.)

É comum na atitude do clero progressista querer identificar o pensamento do Papa Francisco com o seu, ignorando aquilo que o Papa faz de contrário à sua ação e fingindo estar submisso em tudo. Assim os progressistas se atribuem a própria autoridade do Papa.

Isto foi o que o ocorreu no lamentável sínodo da Amazônia. Apesar de ser um sínodo escandaloso e cheio de ambiguidades o Papa recusou os disparates mais desejados pela Teologia da Libertação, como por exemplo a ordenação de homens casados. Mas, mesmo sem a aprovação do Papa os progressistas continuam insistindo neste caminho. Isto para não tratar da aberta oposição que os progressistas faziam ao Papa Bento XVI, como no caso do Motu Proprio Summorum Pontificum, que liberou o uso do Missal Antigo para qualquer padre poder celebrar a Missa Tridentina.

Segundo a argumentação apresentada no citado vídeo o Concílio Vaticano II é um instrumento do ecumenismo, alavancando este a uma espécie de obrigação dogmática de todo o católico.

Para o padre as seitas heréticas e os infiéis, e todas as religiões teriam verdades em diversos níveis e, portanto, os católicos teriam a obrigação de tratar essas verdades de forma positiva, pois nelas também há “raios” da salvação e uma ação objetiva do Espírito Santo. Em razão de existirem níveis diferentes de verdades nas diversas religiões devem existir também diferentes “ecumenismos” em diversos níveis. A consequência de tudo isto é que os católicos em relação as outras religiões devem agir com amor e carinho.

É difícil nessa análise não ver uma malícia do Padre. Na verdade, ele reproduz a heresia modernista, condenada reiteradamente pelo magistério.

A Igreja sempre ensinou que há uma graça do Espírito Santo, chamada Graça Atual, que é uma ação contínua de Deus, nos hereges, nos pagãos, infiéis, satanistas e até nos fundamentalistas e todos que pelo pecado mortal estão com sua alma separada de Deus, que os admoesta pela consciência a buscar a Deus e sua Igreja. Essa graça por si, não serve para a Salvação se não houver o arrependimento e retorno à verdadeira doutrina.

Há também a Graça Santificante que é a graça de estar com a alma unida a Deus, obtida pelo Batismo primordialmente e pelo sacramento da Penitência quando perdemos esse estado pelo pecado mortal. Essa é a Graça que nos faz partícipes da Vida Eterna, só pode ser obtida por meio da Igreja Católica e para aqueles que estão na Igreja Católica. Procurar uma Igreja Cismática ou Herética para obter a graça sacramental é ilícito e o estado de graça não existirá visto que a adesão a heresia ou ao cisma é sempre pecado grave.

É por esta razão que desde os primórdios da Igreja até mesmo nos nossos tempos sempre foi doutrina certa e absoluta que fora da Igreja Católica não há salvação. Esta doutrina sim um dogma com o qual não se pode discordar e clarissimamente definida. Este ensinamento foi muitíssimas vezes repetidos pelos Papas, pelos doutores da Igreja e pelos Santos, mas por brevidade colocamos aqui apenas uma citação do papa Leão XIII, o qual também foi mencionado pelo padre Dall Osto

"(...) oferecer ao homem liberdade (de culto) de que falamos, é dar-lhe o poder de desvirtuar ou abandonar impunemente o mais santo dos deveres, afastando-se do bem imutável, a fim de se voltar para o mal. Isto, já o dissemos, não é liberdade, é uma escravidão da alma na objeção do pecado." (Papa Leão XIII (1878-1903), encíclica Libertas Praestantissimum

Assim nestas seitas, não há a ação Santificante do Espírito Santo e as pessoas que lá estiverem não podem permanecer em estado de graça. Desta forma, a ação do Espírito Santo nestas falsas doutrinas se resume a uma ação que visa ao arrependimento dos hereges e o retorno à Igreja Católica.

Mesmo na Igreja Ortodoxa, citada pelo padre, onde os sacramentos são válidos, não é legitimo se utilizar deles, a não ser em situações de extrema gravidade como a confissão na proximidade da morte e somente se não houver um sacerdote católico. Esta proibição de se utilizar de sacramentos válidos tem origem no fato da Igreja Ortodoxa ser cismática, ou seja, não aceitar a autoridade universal do Papa para toda a Igreja.

Aqui nos permitimos uma pequena digressão. No vídeo o padre mostra todo o seu furor contra aqueles que desejam estar na Igreja, mas não aceitam algumas dos ensinamentos do Vaticano II, mas mostra toda a sua simpatia pela Igreja ortodoxa que não aceita nenhum concílio da Igreja. É muita contradição, é muito cinismo.

Voltemos para a análise das tolices afirmada pelo padre Dell Osto.

Com base em suas afirmações parece que o padre não compreende direito o problema do mal. Não é a quantidade de “verdades” que uma doutrina tenha que faz dela algo bom. O Bem e o Mal não se fazem por estatística. O mal se conceitua propriamente na corrupção do ser ou da ordem. Por exemplo, a falta da saúde é a doença, assim há corrupção do ser. O mal também está presente quando se escolhe erroneamente um bem menor, desprezando o bem maior. Quando um assaltante rouba ele escolhe o bem menor, o dinheiro em detrimento da Justiça que é um bem maior.

Uma análise correta sobre as religiões não deve se limitar a ver o que há de bem nelas, mas, sobretudo se elas atingem a sua finalidade, ou seja, a salvação das almas. Há muita gente que ficou rica no protestantismo, o que de si mesmo é algo bom, porque adquiriu uma disciplina de gastos em sua vida e considerou o sucesso financeiro como sinal e salvação o que dá uma grande motivação ao trabalho. Há muita gente no espiritismo que faz caridade auxiliando aos pobres, o que também em si mesmo é bom, acreditando que desta forma evitará sucessivas reencarnações e assim retornará a divindade mais rapidamente. Há muitos grupos carismáticos que procuram suprir as necessidades alimentares dos pobres, o que sem dúvida é louvável. Há muita gente que critica as práticas do socialismo e do comunismo, o que é ótimo, mas que defendem que há uma filosofia comum que permite a salvação em qualquer religião. Há ainda muita gente que se diz seguidor de São Tomás, que sem dúvida é um mestre inigualável, mas, que defendem a astrologia.

Entretanto, todos esses realizam uma ação que precisa ser fortemente condenada porque comprometem o que há de mais fundamental que é a salvação eterna do homem. Todo o resto tem pouca ou nenhuma importância. E quanto mais houver aparência de bem, maior deve ser a força da condenação porque maior é o perigo para a perdição das almas.

Assim, criticar os erros dos protestantes e o maldito CONIC se faz mais presente do que criticar seitas budistas ou orientais.

Deveria ainda, o sábio estudante do colégio Pio Brasileiro tentar compatibilizar sua argumentação a respeito do ecumenismo, segundo ele, obrigatório pelo Concílio Vatticano II, com os canones do Concílio Vaticano I:

“3012. Como, porém, sem a fé é impossível agradar a Deus [Heb 11,6] e chegar ao consórcio dos seus filhos, ninguém jamais pode ser justificado sem ela, nem conseguir a vida eterna se nela não permanecer até o fim [Mt 10,22;24,13]. E para que pudéssemos cumprir o dever de abraçar a verdadeira fé e nela perseverar constantemente, Deus instituiu, por meio de seu Filho Unigênito, a Igreja, e a muniu com os sinais manifestos da sua instituição, para que pudesse ser por todos reconhecida como guarda e mestra da palavra revelada.” (Dezinguer, Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral, 2ª. edição, p. 646)

“3036 Cân. 6 - Se alguém afirmar ser idêntica a condição dos fiéis e a daqueles que ainda não chegaram a fé única e verdadeira, assim que os católicos possam ter justa razão para duvidar da fé que abraçaram sob o Magistério da Igreja, suspendendo o assentimento até terem concluído a demonstração científica da credibilidade e veracidade da sua fé - seja excomungado.” (Dezinguer, Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral, 2ª. edição, p. 651)

O Padre Dall Ostto deve agora verificar quem está mesmo fora da “caminhada católica”. Seriam todos os bispos do Concílio Vaticano I? Será que ele pensa que o dogma evoluiu, tese amplamente defendida pelos modernistas, e igualmente amplamente condenada? Ou estão fora da Igreja aqueles que defendem o Ecumenismo?

O Papa Gregório XVI, imediatamente anterior ao Concílio Vaticano I e o Papa Pio IX também condenaram veementemente essa ideia de salvação em todas as religiões. Ensinou Gregório XVI

“2730. Outra causa que tem acarretado muitos dos males que afligem a Igreja é o indiferentismo, ou seja, aquela perversa teoria espalhada por toda parte, graças aos enganos dos ímpios, e que ensina poder-se conseguir a vida eterna em qualquer religião, contanto que se amolde à norma do reto e honesto. Podeis, com facilidade, patentear à vossa grei esse erro tão execrável, dizendo o Apóstolo que há um só Deus, uma só fé e um só batismo (Ef 4, 5): entendam, portanto, os que pensam poder-se ir de todas as partes ao porto da Salvação que, segundo a sentença do Salvador, eles estão contra Cristo, já que não estão com Cristo (Lc 11,23), e os que não colhem com Cristo dispersam miseramente, pelo que perecerão infalivelmente os que não tiverem a fé católica e não a guardarem íntegra e sem mancha (Simbol. Sancti Athanasii); ouçam S. Jerônimo, do qual se diz que quanto alguém tentara atraí-lo para a sua causa, dizia sempre com firmeza: O que está unido à Cátedra de Pedro é o meu (S. Hier., ep. 57). E nem alimentem ilusões porque estão batizados; a isto calha a resposta de Santo Agostinho que diz não perder o sarmento sua forma quando está amputado da vide; porém, de que lhe serve, se não tira sua vida da raiz?” (ENCÍLCICA MIRARI VOS, GREGÓRIO XVI, Dezinguer, Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral, 2ª. edição, p. 601).

Já Pio IX, papa do Concílio Vaticano I e da Imaculada Conceição, em sua Encíclica Quanto conficiamur moerore inicia condenando claramente o cerne da argumentação do Padre Dell Osto:

“2865.Convém novamente recordar e repreender o gravíssimo erro, no qual se encontram lamentavelmente diversos católicos, que pensam que chegarão à vida eterna as pessoas que vivem nos erros e afastadas da verdadeira fé e da unidade católica, Essa [opinião] é decididamente contrária à doutrina católica. (ENCÍLCICA Quanto conficiamur moerore, PIO IX, Dezinguer, Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral, 2ª. edição, p. 626).

O magistério da Igreja condena de forma inequívoca a doutrina ecumênica, ainda que possa ser admitida a validade de alguns sacramentos dos hereges e cismáticos. Se houver honestidade intelectual da parte do padre Dell Osto ele, deverá admitir a contradição entre a sua argumentação e o magistério da igreja. Será que ele faria um vídeo admitindo isto?

O padre poderia ainda no vídeo responder algumas perguntas que demonstram bem as suas contradições

Por que condenar de forma tão veemente aqueles que discordam do ecumenismo do Vaticano II e demonstrar tanta simpatia para com os protestantes e cismáticos que não seguem o Concílio Vaticano II?

Por que tanta exigência em obrigar aqueles que não seguem todos os ensinamentos do Vaticano II quando os progressistas se ufanam em afirmar que não seguem e professam todo o ensinamento tradicional da Igreja?

Precisamos ainda nos perguntar como é possível afirmar que qualquer discordância com o Vaticano II traz a exclusão da Igreja, se o Papa Bento XVI criou um instituto, o Instituto do Bom Pastor - IBP que tem como uma das suas finalidades a crítica construtiva ao Vaticano II.

Crítica é sempre crítica, mesmo com o adjetivo que é colocado na sequência, no caso construtiva. Só se critica algo que precisa ser modificado ou melhorado. Ora, uma verdade de fé não admite nenhuma crítica. Não se pode fazer uma crítica construtiva ao que é ensinado no credo.

Mas será que padre Dall Osto segue todo o Vaticano II e, segundo seus ensinamentos, permanece na Igreja?

Vejamos o que ensinou o Vaticano II através da constituição dogmática Sacrossantum Concilium, um documento de hierarquia superior a declaração Dignitates Huamane, em seu número 36:

“36. § 1. Deve conservar-se o uso do latim nos ritos latinos, salvo o direito particular.

§ 2. Dado, porém, que não raramente o uso da língua vulgar pode revestir-se de grande utilidade para o povo, quer na administração dos sacramentos, quer em outras partes da Liturgia, poderá conceder-se à língua vernácula lugar mais amplo, especialmente nas leituras e admonições, em algumas orações e cantos, segundo as normas estabelecidas para cada caso nos capítulos seguintes.”

Portanto, o Vaticano II prescreve o uso do Latim na Missa e somente algumas exceções, como o direito particular já existente, as leituras e nos momentos em que o sacerdote se dirige aos fiéis para orientá-los.

Será que padre Dall Osto celebra sua Missa em Latim? Parece bem razoável acreditar que não. Ele deve esclarecer por que se não o fizer estará, segundo sua própria opinião, fora da Igreja por não aceitar todo o Concílio. Mais grave ainda é que serão bem poucos os sacerdotes que estarão na Igreja.

Quanto ao que o padre chama de “fé intimista”, é por obvio, que o padre extrapola todo bom senso, formulando uma ideia fantasiosa e artificial da vida espiritual. Talvez, muito preocupado em conhecer o Vaticano II ele esqueceu de ler o catecismo que traz uma das verdades mais fundamentais da doutrina católica.

As vezes estudantes de matérias muito específicas, e com pouca fé, mesmo que na Lateranese, acabam abduzidos por um caricato terminológico como “conversão social” que é uma versão naturalista e neutra das obras de caridade material, obrigação de todo católico e que a Igreja nunca deixou de estimular.

A questão é, como ensina o catecismo, que nas obras de caridade vem antes de tudo o amor a Cristo Nosso Senhor e, portanto, à verdadeira doutrina, e a Igreja Católica, única verdadeira e nisto se constitui a caridade. Na versão progressista a caridade, ou melhor, a filantropia, é suficiente em si mesma, sem a necessidade da fé. Vejamos o que ensina São Paulo, talvez um autor que seja considerado fundamentalista pelo padre Dall Osto:

"E ainda que eu distribuísse todos os meus bens no sustento dos pobres, e entregasse o meu corpo para ser queimado, se não tivesse caridade, nada disso me aproveitará" (I Cor, XIII, 3).

Ou seja, filantropia sem fé não tem valor para a salvação. Portanto, quem afirma que o que fazem os hereges e os infiéis não têm valor para a salvação é São Paulo. Nada ecumênico esse São Paulo! Acho que também ele não entendeu o Concílio Vaticano II.

Ao acusar de nestorianismo quem teria uma fé “intimista” (não sabemos exatamente o que o padre quer dizer com isso), por desprezar a encarnação e materialidade de Cristo, o padre confunde, talvez de forma proposital, em que consiste a heresia nestoriana. Na realidade a condenação da heresia nestoriana é também uma condenação da argumentação apresentada pelo padre.

O nestorianismo é uma doutrina herética porque defende que Nossa Senhora, seria somente mãe da natureza humana de Cristo, ou seja, Cristotokos em vez de Mãe de Deus, Teotokos, e que a união do Verbo com o a natureza humana de Cristo seria meramente moral. Portanto era uma heresia de índole materialista posto que o intuito da heresia era desclassificar Nossa Senhora como Mãe de Deus pela negação da unidade da pessoa de Cristo. Ou seja, é uma heresia mais compatível com a ideia progressista e da Teologia da Libertação de Frei Leonardo Boff que pretende separar do “Cristo Histórico” e o “Cristo da Fé” do que com o erro neoplatônico, que pretende dar valor somente aquilo que é espiritual.

Em relação ao docetismo, também a condenação a esta heresia se contrapõem a doutrina apresentada pelo padre.

O Docetismo não é propriamente uma heresia visto que não surgiu pela compreensão errônea de um dogma ou doutrina, mas surgiu fora da Igreja. Esse erro é originado nas primeiras seitas gnósticas não cristãs, que depois influenciaram alguns hereges dos séculos seguintes. (Enciclopédia Católica). Assim, mais uma vez, é um argumento em desfavor às práticas dos infiéis e, demonstra uma preocupação da Igreja, desde o seu início em preservar a pureza da doutrina católica e nenhum interesse em promover o tal diálogo inter-religioso.

Condenamos evidentemente o platonismo e as ideias místicas infelizmente muito presentes nos grupos ditos “conservadores”, mas também muito presente nos grupos da teologia da Libertação que amam mais a Mãe Terra, a Pachamama, a Gaya que a Mãe de Deus! Não obstante, em seu furor de condenar aqueles que seguem o Vaticano II padre Dall Osto parece que se esqueceu que Santo Agostinho se utilizou muito de Platão. Será que Santo Agostinho é conhecido no Pio Brasileiro?

Sobre os ideais GLBTs, feministas e as demais ideias iluministas, para não nos alongarmos muito, lembramos apenas que a recomendação da Igreja sempre foi o confessionário, e não o diálogo, o tribunal da verdadeira misericórdia e caridade. Pois lá é o local por excelência onde Deus tem compaixão pelo Homem e suas misérias e restitui a salvação eterna. Neste ponto, nem mesmo no Vaticano II, há qualquer afirmação em sentido contrário.

Ah! Se os padres ainda entendessem a grandeza da confissão e o bem que ela faz às almas! Se os padres não tivessem esquecido do inferno, para onde vão as almas que morrem sem o estado de graça, quantas verdadeiras conversões teríamos!

Esperamos que o padre não entenda a misericórdia da Igreja, que reata o pecador a Deus, como uma graça que não exige do pecador o arrependimento, pois é impossível reatar com Deus sem aceitar a Moral e a Verdade, que é proveniente desse mesmo Deus.

Que São João Maria Vianney, padroeiro do Padres, possa interceder por eles para que entendam que só bastaria mais confessionários com bons confessores para não se precisar mais de Campanhas da Fraternidade que são apenas a divulgação de ideologias contrárias a Igreja Católica.

 

In die judicii, ut nobis parcas, Domine.

André Roncolato

São Paulo, 16 de fevereiro de 2021.

    Para citar este texto:
"Campanha da Fraternidade 2021: fraternidade com o erro, inimizade com Deus"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/igreja/cf2021/
Online, 22/12/2024 às 06:08:06h