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Pe. Laguérie comenta o documento da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, de 29/06/2007
Pe. Philippe Laguérie
Quarta feira 25 de julho de 2007, http://blog.institutdubonpasteur.org/spip.php?article82
Em seu já célebre discurso de 22 de dezembro de 2005 à Cúria, o Papa tinha anunciado uma releitura do Concílio para dar dele a interpretação autêntica, ou seja, a interpretação da Sé Romana. Este novo documento inscreve-se, evidentemente, nesse trabalho anunciado e empreendido por Bento XVI. Sobre o mesmo tema, já se tinha a declaração Dominus Jesus, cujo principal redator, como todos sabem, foi ele mesmo. Obrigado ao Papa por prosseguir esse trabalho que só ele pode fazer!
Alguns dias apenas após o célebre Motu Próprio, a Congregação para a Doutrina da Fé publica sob a assinatura do Cardeal Levada, seu presidente, cinco respostas sobre o caráter único da Igreja de Cristo que é a Igreja Católica Romana. E como o Instituto do Bom Pastor se comprometeu também a trabalhar nesse sentido e a apoiar o Pontífice Romano para permitir-lhe dar o sentido autêntico do magistério, é muito justo que nós façamos, meus confrades e eu mesmo, um grande eco a essas páginas decisivas para o futuro da Igreja.
1) Que magistério?
O documento, assinado pelo Cardeal Levada, prefeito da Congregação, foi, entretanto, aprovado de forma especial pelo Papa, “ratificado e confirmado” em entrevista particular. É portanto, um magistério do próprio Papa. Tomaremos cuidado, entretanto, apesar da grande autoridade de que ele goza, em não fazer dele um documento infalível, pois, se as três primeiras condições estão bem presentes (autor, assunto e universalidade dos destinatários), falta evidentemente a principal que é a vontade de obrigar a acreditar e a sustentar. Entretanto, se faria mal em subestimar um tal texto: ele representa a interpretação autêntica que o Papa faz do Concílio. Pois, Deo gratias, ela começou, indiscutivelmente.
2) Um documento preciso
Uma introdução, cinco curtas questões e respostas rápidas. O conjunto cabe em duas páginas, sem contar duas outras, exclusivamente de referências. O resultado é uma impressão de clareza muito agradável. Uma sociedade, qualquer que seja, deve ser dirigida assim, por alguns textos claros e precisos, como nos bons velhos tempos dos bons velhos Papas! Ao contrário da legislação européia, por exemplo, que já não está cabendo em uma biblioteca monumental, muito menos na cabeça de uma pessoa de bem, nem que fosse um especialista. Contendo – perdoem-me os leitores – centenas de páginas sobre o tamanho dos botões da roupa de baixo, para as quais, evidentemente, ninguém dá a mínima! Aqui, o Papa tem a coragem de enfrentar com determinação uma das doutrinas mais controvertidas e mais agitadas pelo mau espírito do Concílio, por ele denunciado, e de voltar ao texto bruto. Belo trabalho realmente, de desarmar as minas, de maneira sistemática, corajosa e lúcida.
3) Um princípio definitivo (primeira questão)
Com grande reforço de citações do próprio Concílio e dos Papas precedentes, o Papa atual explica que o Concílio não quis mudar a doutrina anterior, não a mudou de fato, e se compreende facilmente – mesmo se somos nós que o acrescentamos explicitamente – não poderia mudá-la. Porque há alguma coisa de irreformável na doutrina dogmática sobre a Igreja, de que se trata evidentemente aqui. Sabe-se, aliás, que a intenção oficial de todos os Papas e Bispos do Concílio era precisamente de não definir nada. Isso basta para dizer que, conseqüentemente, não só eles não podiam introduzir doutrinas contrárias ao magistério precedente, mas mesmo que eles não podiam introduzir doutrinas simplesmente novas, por mais que fossem justas e tiradas do depósito da Revelação.
Esse grande princípio de hermenêutica vai ficar portanto para o que vier depois: é à luz do Magistério anterior e portanto da Tradição da Igreja que deverão ser levantadas todas as dificuldades, contradições e equívocos devidos, no próprio texto, ao mau espírito do Concílio. Pois no fim das contas, vai ficar para sempre esse escândalo histórico de que foi necessário, 40 anos mais tarde, toda a autoridade de um Pontífice luminoso para eliminar uma a uma todas as armadilhas de uma “anfibologia” quase institucional. O Papa cita em referência as inumeráveis questões dos padres do Concílio todas pedindo que fossem esclarecidas as citações incriminadas e às quais foi respondido invariavelmente que a doutrina tradicional estava claramente expressa!
4) Uma doutrina definitiva (segunda e terceira questões):
Não apenas porque o Papa o diz claramente, mas porque é a doutrina do magistério mais solene da Igreja: A única Igreja fundada por Cristo, exatamente de acordo com a nota de unicidade do nosso Credo, é a Igreja Católica Romana, com o Papa à frente. O termo “subsiste” empregado pela Lumen Gentium indica apenas uma permanência no ser histórico dessa única Igreja, com todos os elementos instituídos por Cristo, na Igreja Católica “na qual se encontra concretamente a Igreja de Cristo sobre esta terra”. Não se pode ser mais claro! Vê-se aqui que o verbo subsistir toma aqui um sentido equivalente, até mesmo mais intenso que o verbo ser: o de uma permanência na unicidade do ser.
Mas por que, prossegue o Papa, utilizar esse termo subsistir no lugar do verbo ser, especificando também essas conotações? Para indicar que um certo número de elementos pertencentes, de modo próprio, a esta única Igreja de Cristo, encontram-se entre os cismáticos. Pode-se discutir se este era o melhor meio. E, verdade seja dita que, em vista dos quarenta anos de saliva e de tinta gastos por causa disso, não é lá muito certo que esse fosse o melhor! Mas ninguém pode de agora em diante utilizar esse texto para sustentar que haja outros modos de subsistência da Igreja de Cristo, em sua unicidade, outras Igrejas “normais”, de direito divino. A todas elas falta alguma coisa da Igreja de Cristo e elas têm que pedir e receber tal coisa da Única que possui a identidade adequada à fundação de Jesus Cristo.
5) Os elementos constitutivos ou essenciais (quarta e quinta questões).
O Papa fala de três elementos constitutivos da Igreja de Cristo, no resto do documento. A verdadeira sucessão apostólica, a realidade do sacramento da eucaristia, e a comunhão com a Igreja Católica e portanto com o Papa, seu chefe. Só a Igreja Romana, possuindo esses três elementos constitutivos da Igreja de Cristo, pode ser a Ela, por esse motivo, identificada. O segundo desses três elementos não apresenta nenhuma dificuldade: os católicos e os ortodoxos são os únicos a possuir esse tesouro da missa em toda sua amplitude, sendo o meio disso o sacramento da ordem, igualmente conservado por eles. O primeiro já coloca uma dificuldade teológica real; sem dúvida a sucessão apostólica é sacramentalmente idêntica entre os ortodoxos e os católicos. Mas é evidente também que não há bispo legítimo sem a comunhão com o Pontífice Romano, o bispo dos bispos. Esta segunda condição tem muito a ver com a terceira. E se os bispos ortodoxos são sacramentalmente verdadeiros bispos, sua sucessão apostólica formal é gravemente maculada por essa falta de comunhão. Assim, o elemento por eles conservado é bem mais a realidade do sacramento da ordem em sua plenitude que a sucessão apostólica. Após esse esclarecimento, o Papa admite portanto que os ortodoxos, ao conservarem esses dois elementos tem um direito real à denominação de igrejas (particulares sempre). Por outro lado, nenhuma comunidade proveniente da reforma tem direito a isso, por não possuir nem verdadeiro sacerdócio, nem Eucaristia. O Conselho Ecumênico das Igrejas tem negada a legitimidade de seu título, diga-se de passagem.
Pois o Papa afirma que a sucessão apostólica é um “elemento essencial constitutivo da Igreja”, enquanto a comunhão, a única coisa que falta aos ortodoxos, é apenas “um de seus princípios constitutivos internos” (não essencial portanto), ainda que não seja um mero complemento exterior da igreja particular. Todos esses princípios são, portanto, constitutivos da única Igreja desejada por Cristo e é por isso que só a Igreja Romana, ao possuir todos eles, pode ser essa Igreja.
Dito de outro modo, entre os elementos constitutivos, há alguns que são essenciais, que justificam sozinhos que se fale de igreja. Isso é bom senso e verdadeira filosofia. Tomemos um exemplo: a saúde, para um homem, é um constitutivo interno de seu ser; mas ela não poderia ser um constitutivo essencial: um homem doente é evidentemente um homem verdadeiro, embora deficiente, até a incapacidade total, talvez. Do mesmo modo, um homem desprovido do uso da razão: falta-lhe um constitutivo interno do homem (o uso da razão), mas não um elemento essencial de seu ser (a racionalidade).
Assim os ortodoxos constituem verdadeiras igrejas, sempre particulares, enquanto as outras não o poderiam constituir, sendo desprovidas das características essenciais de uma igreja. O Papa devolve assim à Igreja Católica Romana, depois de tantas humilhações sofridas, seu lugar único de esposa de Cristo Jesus.
(tradução e destaques nossos)
(tradução e destaques nossos)
Para citar este texto:
"Pe. Laguérie comenta o documento da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, de 29/06/2007"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/igreja/blog_laguerie20070729/
Online, 21/11/2024 às 08:44:43h