O PAPA LEVANTA A EXCOMUNHÃO DOS BISPOS LEFEBVRISTAS!
Christian Terras
Como indicávamos em nosso semanário Golias Hebdo e nosso jornal on line golias.fr de 13 de novembro último, o Papa Bento XVI se prepara para levantar a sanção de excomunhão pronunciada em 1988 por seu predecessor João Paulo II contra os quatro bispos tradicionalistas entronizados por Dom Lefebvre: o suíço Bernard Fellay, o francês Bernard Tissier de Mallerais, o inglês Richard Williamson e o espanhol Alfonso de Galarreta.
De acordo com informações que temos, o decreto concernente a esta decisão já está assinado. Ele será publicado nos próximos dias. Dom Bernard Fellay, bispo e superior da Fraternidade São Pio X, tinha, com efeito, pedido a seus fiéis, no fim do mês de outubro passado, que recitassem um milhão de rosários entre 1º. de novembro e 25 de dezembro para que a decisão do Papa de levantar a excomunhão dos bispos lefebvristas se concretizasse.
Lembremos que o Papa Bento, logo depois de eleito, tinha recebido em sua residência de verão, em Castelgandolfo, Dom Fellay, no fim do mês de agosto de 2005. Um sinal forte era assim lançado não somente aos tradicionalistas do falecido Dom Lefebvre, mas também ao conjunto dos bispos franceses, principalmente, para lhes dar a entender que ele conduziria seu projeto de reunificação do catolicismo até o fim (ver principalmente nosso dossier “O papa está pronto a levantar a excomunhão, O retorno dos integristas” em Golias, no. 106 de janeiro-fevereiro de 2006).
O que se predecessor tinha tentado fazer em várias ocasiões no fim de seu pontificado mas que não tinha podido levar a termo em razão de sua doença ( ver principalmente nosso dossiê “As negociações secretas ROMA-ECONE em Golias no. 79 de julho-agosto de 2001).
A medida que o atual soberano pontífice acaba de tomar, segue assim à outras tentativas de reunificação dos lefebvristas levadas a efeito por Bento XVI com, em particular, a reabilitação em julho de 2007 da “missa tridentina” em latim “abandonada” pelo Concílio Vaticano II (1962-1965).
Especifiquemos que em junho de 2008, Bento XVI renunciou também a exigir dos fiéis de Dom Lefebvre, representados pelo Fraternidade Sacerdotal São Pio X (FSSPX) o reconhecimento do Concílio Vaticano II que abordava, entre outras coisas, a questão da liberdade religiosa e de uma Igreja aberta ao mundo, duas problemáticas sobre as quais os lefebvristas não estavam dispostos a entrar em acordo, considerando-as como desvios senão como heresias! O Vaticano tinha então apresentado essa mão estendida como uma proposta de “retorno à comunhão”.
Dom Fellay, superior da Fraternidade São Pio X tinha então recusado a medida pontifical, sob o pretexto de que havia outros problemas em suspenso que era preciso acertar. Subentendidos o levantamento das excomunhões e o futuro estatuto da Fraternidade São Pio X. Paralelamente, o Cardeal Castrillon de Hoyos (sic), presidente da Comissão Ecclesia Dei, encarregada do dossiê dos lefebvristas, tinha escrito a Dom Bernard Fellay, apresentando-lhe cinco condições em vista da plena reintegração da fraternidade cismática. Ele tinha pedido prioritariamente aos bispos lefebvristas “evitar toda intervenção pública que não respeitasse a pessoa do Santo Padre ou que fosse negativa para a caridade eclesial”, mas também “evitar a pretensão de um magistério superior ao Santo Padre e não propor a Fraternidade em contraposição à Igreja”. Notou-se, na época, que nessas cinco proposições não está pedido explicitamente aos bispos da Fraternidade São Pio X que reconhecessem o Concílio Vaticano II...
Segundo nossas fontes, são o Cardeal Castrillon Hoyos e Monsenhor Perl, prelado luxemburguês que o sucederá logo mais a frente da Comissão “Ecclesia Dei”, que redigiram junto com um prelado italiano, Monsenhor Mario Marini, um texto de reconciliação no sentido do levantamento das excomunhões dos quatro bispos lefebvristas.
De acordo ainda com nossas informações, não se tratará de um reconhecimento pleno e inteiro da Fraternidade São Pio X mas de um simples levantamento da sanção de excomunhão, maneira de reconhecer a boa fé e o sentido eclesial dos “cismáticos”, já que o pleno acordo sobre o futuro estatuto jurídico da Fraternidade São Pio X não está ainda finalizado. Alguns pensam que a Fraternidade São Pio X poderia ser erigida como uma prelazia pessoal do Papa, no modelo da Opus Dei. Ora, os responsáveis dessa última vêem com desagrado tal perspectiva que lhes tiraria o estatuto de exceção que tem desde 1983, em conseqüência de uma decisão de João Paulo II.
Por ora, conforme seu costume, o Papa Bento XVI avança pouco a pouco, a questão do futuro estatuto da Fraternidade São Pio X virá a seu tempo... O essencial para ele hoje é tratar os bispos lefebvristas como se eles não tivessem sido excomungados, o que é uma maneira bem romana, definitivamente, de no mínimo “relativizar” essa excomunhão, sem por outro lado, se desdizer completamente!
É claro, enfim, que essa decisão do Papa Bento XVI, que será provavelmente oficializada em 24 de janeiro próximo, fará reagir, de maneira crítica, numerosas comunidades católicas, muito especialmente na França e na Suiça.
Tal aproximação com os “integristas” de Dom Lefebvre só pode, com efeito, ser entendida com um questionamento radical dos progressos do Vaticano II (ver sobre isso nossa obra “O retorno dos integristas”, nas Edições Golias).
Tanto mais que nesse domingo 25 de janeiro de 2005, a Igreja Católica se lembrará que há exatamente cinqüenta anos, o bom Papa João XXIII convocava um concílio ecumênico! (ver Golias Hebdo, no. 64, de quinta-feira 22 de janeiro, “Do Vaticano II ao Vaticano menos II). Foi em 25 de janeiro de 1959! E esse foi o Concílio Vaticano II que aconteceu de 1962 a 1965. Entender-se-á então que, na véspera dessa data simbólica, a publicação da decisão do Papa Bento XVI levantando a excomunhão dos partidários de Dom Lefebvre, tem um valor mais que simbólico para os partidários de uma restauração intransigente do catolicismo. E, ao mesmo tempo, um voto de desconfiança a todos aqueles e aquelas que trabalharam durante anos a por em prática, em toda parte em que fossem chamados em missão, o espírito e as reformas do Vaticano II.
NB: ver também nossa análise em seguida sobre a interpretação do Vaticano II levando em conta a reaproximação com os lefebvristas e a leitura feita pelos católicos conservadores partidários de uma linha de restauração e de uma autocentração identitária da Igreja Católica.