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Palestra do Monsenhor Guido Pozzo sobre o crescimento da Missa Tridentina no mundo
Alberto Zucchi
Apresentamos aos nossos amigos e leitores a palestra “Esperança para o futuro da Igreja” proferida no dia 14 de setembro de 2.017 pelo Arcebispo Guido Pozzo, presidente da Pontifícia Comissão Ecclesia Dei, para a quinta Conferência Summorum Pontificum em Roma. Nesta ocasião a Montfort foi representada por um de seus diretores, Alex Chirata.
Um dos pontos que merecem destaque nesta palestra são as estatísticas de crescimento da celebração da Missa Antiga por todo o mundo. Infelizmente, Monsenhor Pozzo não possuía dados a respeito do Brasil, se Deus quiser, até a próxima edição do Summorum Pontificum, a Montfort deverá ter elaborado estes dados e os enviará a Comissão Ecclesia Dei.
Dentre as palavras da conferência, uma consideração merece especial atenção
"A restauração da antiga liturgia gregoriana não é... um passo atrás, mas um olhar para o futuro da Igreja, que nunca pode construir-se destruindo ou escondendo a riqueza espiritual, litúrgica e doutrinária de seu passado... Celebrar o rito antigo significa olhar com esperança para o futuro da Igreja ".
Evidentemente esta não é a consideração que muitas das autoridades eclesiásticas têm sobre o “Motu proprio Summorum Pontificum". Ao contrário, elas apresentam a Missa Antiga como algo ultrapassado na história da Igreja e que deve ser superado e cuja concessão representa apenas um favor a católicos “saudosistas”. O próprio monsenhor Pozzo fala em “preconceitos ideológicos”. E neste mesmo sentido explica-se a crítica feita na conferência aos seminários que não prepararam os sacerdotes para a celebração da Missa Tridentina.
Também merece destaque a consideração dos motivos pelos quais existe a prevenção contra a celebração da Missa na forma Extraordinária:
“...fazem parte de um contexto mais amplo e consideram, em termos gerais, o entendimento comum do Concílio Vaticano II, difundido pela recepção e aplicação do ensino do Concílio, e a uma certa forma de entendê-lo. Este entendimento comum baseia-se na ruptura e na descontinuidade com a Tradição e com a integridade e a plenitude da Fé Católica transmitida pelo Magistério constante da Igreja.”
Ora, se o entendimento comum do Concílio Vaticano II é de que houve uma ruptura e descontinuidade com a Tradição, as autoridades eclesiásticas deveriam se perguntar como foi possível chegar a este entendimento. Não é absurdo, ao menos supor, que o problema está no próprio texto do Concílio e não apenas nas interpretações.
Como nossos leitores poderão constatar na leitura da palestra há, ainda, outros elementos importantes e que serão úteis para argumentar contra aqueles que não desejam que o Rito Antigo se difunda pela Igreja, entretanto, cabe destacar que não nos parece correto afirmar que as Missas no Rito Extraordinário e Ordinário devam conviver juntas uma ao lado da outra. Para isto basta ver os frutos de cada uma. Ademais, convém lembrar que o que pretendia o Papa Bento XVI era promover uma reforma do Rito Ordinário para aproxima-lo do Rito Antigo.
Mosenhor Pozzo comenta também uma questão fundamental em relação a mudança da Missa, o fato de que o rito Ordinário permite a inclusão de mudanças originadas na “comunidade”. Esclarece ele:
“De acordo com esta ideia, antes da reforma litúrgica, o sacerdote era responsável pela liturgia, enquanto que a partir do Vaticano II é responsável pela comunidade reunida. Assim, conclui-se, a comunidade é o verdadeiro assunto da liturgia e determina o que deve acontecer nela. Certamente é verdade que, na antiga liturgia, o sacerdote nunca teve o direito de decidir por si próprio o que deveria acontecer”.
Para Mosenhor Pozzo, aqui também existe um erro de interpretação em relação ao Missal de Paulo VI, pois a Missa Antiga
“Ela não foi organizada pela vontade do clérigo, mas ao contrário, veio antes dele como um ritual sagrado, a forma objetiva da oração comum da Igreja. A polêmica "sacerdote versus comunidade" é sem sentido. Destrói o entendimento autêntico da liturgia e cria um abismo entre o pré e pós-conciliar, o que destrói o grande vínculo da história viva da fé.”
Entretanto, cabe ressaltar que não se trata apenas de uma questão de má interpretação. Vejamos o que é afirmado em uma das primeiras edições da editora Ave-Maria, do Missal do Novus Ordus no Brasil, em 1.969.
“Na liturgia não se trata em primeiro lugar e somente de serem exatos os gestos e bem pronunciadas as fórmulas. Anterior a rubrica, há uma realidade viva a ser celebrada pelo povo. Por isso a celebração litúrgica deve possuir um dinamismo interno, que arrasta para dentro de si a vida e a presença de toda a assembleia sacerdotal.
As rubricas são decorrência desta realidade profunda. Elas procuram oferecer meios para que esta realidade possa ser vivida e expressa em ritos simples e funcionais.
Conhecer assim as rubricas, significa colocar fim ao formalismo, que transforma o Celebrante em autômato, para fazê-lo chegar ao desempenho da função presbiteral.
Dentro deste espírito, o “Ordo” deverá ser recebido como “roteiro”, esquema para a celebração; e nunca como “Missa pronta, acabada”, que só necessita de ser “dita” automaticamente”. (o sublinhado é nosso)
Ora, o referido Missal foi aprovado pela Comissão Central da CNBB e confirmado pela Sagrada Congregação do Culto Divino. Não é razoável afirmar que querer que a Missa Nova não seja um “texto pronto” seja apenas um problema de interpretação.
A seguir a palestra proferida por Monsenhor Pozzo.
“Esperança para o Futuro da Igreja”, palestra proferida pelo Monsenhor Guido Pozzo, arcebispo e presidente da Comissão Eclesia Dei no congresso “O Motu próprio Summorum Pontificum de Bento XVI: Uma Renovada Juventude para a Igreja”
A opinião pública tem visto o motu proprio como uma concessão aos chamados grupos tradicionalistas, e particularmente como uma forma de congraçar a Fraternidade Sacerdotal São Pio X e superar a ruptura com ela. Certamente, não se pode negar que este motivo estava no centro das atenções, uma vez que nenhum Católico pode se alegrar por uma fratura na Igreja. No entanto, seria simplificado e completamente insuficiente considerar apenas esse motivo. Na carta que acompanhou o motu proprio, Bento XVI reafirmou que o Concílio Vaticano II não revogou os antigos livros litúrgicos, mas queria uma revisão deles, sem ruptura ou cancelamento da tradição anterior. O motu proprio, portanto, não visa a uniformidade litúrgica, mas sim a reconciliação dentro da Igreja, transmitindo as duas Formas, Ordinária e Extraordinária, para viverem juntas uma ao lado da outra, respeitando suas características específicas, já que na história da liturgia, sempre houve uma multiplicidade de ritos e variantes dentro do Rito Romano.
Deste ponto de vista, podemos afirmar com calma que nossa avaliação desta década tem sido principalmente positiva, uma vez que o reconhecimento disso cresceu em muitas dioceses individuais, e a desconfiança mútua diminuiu progressivamente, embora devagar, e não sem algumas dificuldades iniciais. Especialmente na França e nos Estados Unidos, onde as celebrações da Missa na Forma Extraordinária são mais numerosas, o resultado pode ser considerado frutífero e encorajador, graças também ao trabalho apostólico dos institutos sob a jurisdição da Pontifícia Comissão Ecclesia Dei. Na França em particular, em muitas dioceses, pelo menos um lugar é encontrado onde a Missa é celebrada no usus antiquior. O interesse pela liturgia antiga tem sido uma surpresa positiva também no Extremo Oriente e na Europa do Leste. A recepção foi justa na Itália, embora mais em algumas regiões do que outras. Algumas estatísticas podem ser de interesse, comparando a situação de dez anos atrás com a de hoje.
Na França, havia 104 celebrações dominicais do antigo rito em 2007; hoje há 221 (mais do que o dobro); se aquelas da Fraternidade São Pio X forem incluídas, o número atinge 430.
Na Alemanha, realizavam-se 35 celebrações dominicais em 2007; hoje há 54. 153, se as missas mensais e as celebradas apenas durante dias da semana forem incluídas.
Na Grã-Bretanha, realizavam-se 18 celebrações dominicais em 2007; em 2017, 40.
Na Itália, havia 30 em 2007; em 2017, 56 aos domingos, 107 se as mensais e de dias de semana forem incluídas.
Nos Estados Unidos, havia 230 em 2007, enquanto hoje existem 480, não incluindo aquelas da Fraternidade São Pio X.
Na Polônia, havia apenas 5, enquanto que em 2017 já são 40.
Apesar dessas estatísticas encorajadoras, isso não significa que todos os problemas tenham sido substancialmente resolvidos. Existem problemas de natureza prática, como, por exemplo, a escassez de sacerdotes disponíveis ou adequados para celebrar a Missa no Vetus Ordo. Isso muitas vezes impede o Ordinário local de satisfazer os pedidos de um grupo estável de fiéis. Há também problemas ligados a preconceitos ideológicos e outros de caráter mais pastoral. Alguns bispos se queixam de que grupos individuais de fiéis dentro de um grupo estável nem sempre estão devidamente integrados na vida pastoral da Igreja local, com o risco de um certo isolamento. Este isolamento, no entanto, não se deve ao uso da Forma Extraordinária, mas a outros fatores que a Igreja local deve examinar especificamente. É dever do Ordinário, obviamente, garantir a harmonia e participação ativa na vida da diocese, em conformidade com a lei universal da Igreja. O sacerdote encarregado pelo bispo de celebrar o usus antiquior deve ter um papel importante no encorajamento de tal harmonia e participação por parte dos fiéis que são membros de um grupo estável ligado à Forma Extraordinária.
Do ponto de vista qualitativo, considero muito importante falar da atitude mental e espiritual da maioria dos fiéis que seguem a antiga liturgia. Não é a atitude das pessoas orientadas para o passado, mas uma expressão de sua vontade e desejo de ancorar o espírito em algo perene, ao tesouro da graça preservado no patrimônio litúrgico da tradição. Precisamente porque esse patrimônio é perene, mesmo em sua forma litúrgica, é sempre atual. Como o Papa Bento XVI declarou na carta que acompanhava o motu proprio: "O que as gerações anteriores consideravam sagrado, permanece sagrado e ótimo para nós também, e não pode ser de repente completamente proibido ou mesmo considerado prejudicial”.
O fato de que muitos dos fiéis que participam do rito no Vetus Ordo são jovens e vêm de famílias jovens, mostra que não é "nostalgia" do passado que motiva sua escolha. A este respeito, é muito promissor que os jovens sacerdotes estão mais disponíveis e abertos para (a celebração do antigo rito). É claro que sua preparação para isso está ocorrendo já durante a formação no Seminário. A este respeito, devemos notar o atraso ou negligência por parte da maioria dos Seminários em ensinar a Forma Extraordinária da liturgia para os seminaristas interessados, o que, obviamente, inclui lugares onde existem necessidades pastorais para a celebração do antigo Rito Romano.
Certamente, também devemos mencionar o aumento constante das vocações sacerdotais nos institutos sob a jurisdição da Pontifícia Comissão Ecclesia Dei, em particular na Fraternidade Sacerdotal São Pedro, no Instituto Cristo Rei e no Instituto do Bom Pastor.
Em uma avaliação que busca ser precisa, mas não superficial ou polêmica, não podemos ignorar o fato de que, em alguns lugares, e em casos específicos, ainda existem dificuldades na aplicação e recepção do ensino e normas do motu proprio e da instrução de acompanhamento Universae Ecclesiae da Pontifícia Comissão Ecclesia. Isso certamente não deve nos surpreender, uma vez que essas dificuldades fazem parte de um contexto mais amplo e consideram, em termos gerais, o entendimento comum do Concílio Vaticano II, difundido pela recepção e aplicação do ensino do Concílio, e a uma certa forma de entendê-lo. Este entendimento comum baseia-se na ruptura e na descontinuidade com a Tradição e com a integridade e a plenitude da Fé Católica transmitida pelo Magistério constante da Igreja. No entanto, também devemos reconhecer que, nos anos que se seguiram à publicação do motu proprio, muitas dificuldades foram superadas e, em geral, por parte dos bispos e do clero, um maior favorecimento para com aqueles que preferem a Forma Extraordinária do Rito Romano. Muitas vezes, a incapacidade do Ordinário de satisfazer o pedido dos fiéis que pedem a celebração da Missa na antiga liturgia surge, como mencionei anteriormente, da falta de sacerdotes que não só estejam dispostos, mas também adequados (isto é, verdadeiramente capazes) de celebrar o ritual sagrado na Forma Extraordinária.
Para concluir esta breve avaliação, acredito que podemos reconhecer que, desde que o Summorum Pontificum tornou-se legalmente ativo, houve uma grande recuperação, por parte de muitos dos fiéis, e especialmente dos jovens sacerdotes e leigos, desse patrimônio da Igreja. Este patrimônio é um tesouro a ser protegido e transmitido em toda a sua beleza e santidade, sem interferências ideológicas de qualquer partido. Isso certamente será para o benefício de todos, mesmo para aqueles que seguem a forma ordinária da liturgia.
A fim de considerar as perspectivas para o futuro de uma maneira sincera e completa, penso que é necessário voltar a um aspecto fundamental do Summorum Pontificum, ou seja, o desejo de curar a fratura, não apenas litúrgica, mas eclesiológica, entre o antigo e o novo. Em vez de opor o antigo rito ao novo, acredito que o antigo rito, com seu patrimônio de fé e santidade, possa enriquecer o novo; enquanto o novo, por sua vez, pode representar essa legítima aspiração para o desenvolvimento teológico e litúrgico em continuidade e fidelidade à Tradição.
Precisamente porque a reforma litúrgica desejada por Paulo VI teve como objetivo levar a cabo esse desenvolvimento, ordenado em continuidade com a Tradição, podemos e devemos nos perguntar: quais são as causas do eclipse do Sagrado que sobrepujaram a liturgia da Igreja após a reforma, e levou muitos católicos a procurar em outros lugares, fora da Igreja, a resposta para o desejo irreprimível do homem por Deus e o mistério? É mais importante do que nunca o que Bento XVI, na carta que acompanhou a publicação do motu proprio, em um ponto afirma: "O restabelecimento do Vetus Ordo do Missal Romano ajudará a celebração da Missa de acordo com o Missal de Paulo VI para demonstrar, mais poderosamente do que já foi o caso até agora, aquela sacralidade que atrai muitas pessoas para o antigo uso”.
Portanto, vemos que a discussão das perspectivas futuras para o uso do rito antigo não é principalmente uma discussão sobre a quantidade (o aumento no número dessas celebrações, ou o número de grupos estáveis que a solicitam, etc.). É uma discussão sobre a qualidade e substância, isto é, que considere o destino do ressurgimento da vida de fé e da vida litúrgica da Igreja.
Aqui, então, está o ponto crucial das disputas sobre a antiga liturgia e a reformada. O restabelecimento do Vetus Ordo, seu grande contributo, deve ser visto como o antídoto para essa criatividade arbitrária (na liturgia) que faz desaparecer o mistério e as tendências alarmantes que minimizam a natureza sacrificial da Eucaristia, especialmente em nome de uma falsa ideia de maior compreensão e acessibilidade ao sacramento.
Por outro lado, é tão importante garantir que a liturgia antiga não seja vista como um elemento de perturbação ou uma ameaça à unidade da Igreja, mas sim como um presente ao serviço da construção do corpo de Cristo. A preciosa herança do patrimônio litúrgico tradicional não deve, portanto, ser ancorada no passado, mas também acessível no presente e no futuro. Caso contrário, a continuidade da Igreja através de várias eras e gerações está em perigo. Isto, obviamente, não exclui que, no futuro, possa surgir uma convergência em uma única forma comum. No entanto, isso será o resultado de um processo de crescimento dentro da Igreja, não uma imposição burocrática ou formal de cima. A perspectiva atual é que este período deve ser de enriquecimento mútuo das duas formas, ordinária e extraordinária.
Como foi afirmado de forma autoritária várias vezes, isso não é uma questão de contraste entre Summorum Pontificum e as reformas do Concílio, mas sim de promover e preservar sua identidade, para que essas mesmas reformas do Concílio possam ser realizadas, compreendidas e tornadas frutíferas em consonância com a Tradição da Igreja. A imagem que ainda hoje é apresentada em muitos lados, de uma alternativa entre um mundo pré e pós-conciliar, é totalmente falsa e, portanto, deve ser rejeitada. De acordo com esta ideia, antes da reforma litúrgica, o sacerdote era responsável pela liturgia, enquanto que a partir do Vaticano II é responsável pela comunidade reunida. Assim, conclui-se, a comunidade é o verdadeiro assunto da liturgia e determina o que deve acontecer nela. Certamente é verdade que, na antiga liturgia, o sacerdote nunca teve o direito de decidir por si próprio o que deveria acontecer. Ela não foi organizada pela vontade do clérigo, mas ao contrário, veio antes dele como um ritual sagrado, a forma objetiva da oração comum da Igreja. A polêmica "sacerdote versus comunidade" é sem sentido. Destrói o entendimento autêntico da liturgia e cria um abismo entre o pré e pós-conciliar, o que destrói o grande vínculo da história viva da fé.
Em contraste, o Catecismo da Igreja Católica (1069) apresenta claramente o que é permanentemente válido e preservado pela grande tradição. A liturgia significa "serviço do povo para o povo". O "Serviço do povo" pressupõe o ensino de que o povo não é criado de baixo, mas em virtude do ministério pascal de Jesus Cristo e, portanto, é baseado no ministério de outro, ou seja, do Filho de Deus. O povo de Deus não existe simplesmente, como existe o francês, o italiano, o espanhol etc. Ele surge continuamente novamente em virtude do Filho de Deus, encarnado, morto e ressuscitado, e pelo fato de Ele nos levantar para a comunhão com Deus, a quem nunca podemos alcançar por nós mesmos. Na tradição cristã, o termo "liturgia" significa que o povo de Deus participa da obra de Deus.
O Catecismo cita a Constituição Sacrosanctum Concilium, segundo a qual toda obra litúrgica é obra de Cristo, que é o Sumo Sacerdote e do Seu corpo, que é a Igreja.
Isso apresenta o assunto em sua verdadeira profundidade. A liturgia pressupõe que o Céu está aberto; se o Céu não é aberto, a liturgia é menosprezada em sua essência, tudo é reduzido a uma questão de papéis, a busca da autoconfirmação da comunidade, na qual o divino não existe mais. Contra o que o Papa Francisco chama de risco para os cristãos de auto-referencialidade, o fato decisivo que deve ser enfatizado é que a liturgia é a obra de Deus ou não existe. Esta primazia de Deus e de Sua ação vem com uma abertura universal encontrada em toda liturgia, que não pode ser entendida como uma questão de fenomenologia ou a referência da comunidade a si mesma, mas somente pelas categorias cristológicas e teológicas do povo de Deus e do Corpo de Cristo.
Somente neste contexto, podemos entender a relação mútua entre o sacerdote e a comunidade dos fiéis. O sacerdote faz e diz na liturgia o que lhe é próprio, mas ele não pode fazer e dizer algo de si próprio; ele atua em persona Christi. Ele não é o delegado da comunidade; em vez disso, em sua representação sacramental de Cristo como chefe da Igreja, ele expressa o primado de Cristo, que é a condição mais básica de toda liturgia Católica. É precisamente porque o sacerdote representa esta primazia de Cristo, que ele permite que a congregação dos fiéis vá além de si mesma, para o Céu, na direção de Cristo que elimina toda barreira terrena.
Bento XVI, enquanto ainda cardeal, escreveu que "A Igreja se levanta e cai com a Liturgia. Quando a adoração da Trindade divina declina, quando a Fé já não aparece na sua plenitude na liturgia da Igreja, quando as palavras do homem, seus pensamentos, suas intenções a sufocam, a Fé perderá o lugar onde é expressa e onde ela mora. Por essa razão, a verdadeira celebração da sagrada liturgia é o centro de qualquer renovação da Igreja". (Introdução ao Espírito da Liturgia).
A liturgia do rito antigo nos lembra, através do silêncio, as repetidas genuflexões, a reverência, da distância infinita que separa o Céu da Terra; Isso nos lembra que nosso horizonte não é o da Terra, mas o do Céu, que nada é possível sem o sacrifício de Cristo, e que a vida sobrenatural é um mistério. Isso não é, no entanto, uma questão de colocar o rito antigo em competição com o missal reformado. É mais uma questão de entender como a liberdade restaurada para celebrar de acordo com os antigos livros litúrgicos cria uma nova barreira para o avanço do secularismo e uma concepção sociológica que exalta a comunidade e esconde a realidade do Cristo como um todo, Cabeça e Corpo. Portanto, podemos dizer que o antigo Rito Romano constitui uma resposta radical ao desafio da secularização e do "laicismo", ao humanismo anticristão e sociológico da nossa era. Certamente, não é o único rito possível, mas expressa fielmente a eclesiologia da Igreja Católica, que é dogmática, mas pode ser expressa por diferentes ritos ou formas do mesmo rito.
A restauração da antiga liturgia gregoriana não é, portanto, um passo atrás, mas um olhar para o futuro da Igreja, que nunca pode se construir destruindo ou escondendo a riqueza espiritual, litúrgica e doutrinária de seu passado. Da mesma forma, ela nunca pode se fechar para a renovação e o desenvolvimento, que deve sempre ser coerente com a Tradição. Celebrar o rito antigo significa olhar com esperança para o futuro da Igreja, no centro do qual fica a cruz de Cristo, tal como está, (e deve estar de pé) no centro do altar. Cristo é o Sumo Sacerdote para quem a Igreja volta a sua face, hoje, ontem e para sempre.
Gregory DiPippo postado quinta-feira, 21 de setembro de 2017 Fonte: http://www.newliturgicalmovement.org/2017/09/archbishop-pozzo-on-summorum-pontificum.html?m=1#.WcymjLpuLIU
Tradução, Montfort: Ricardo Sampaio
Para citar este texto:
"Palestra do Monsenhor Guido Pozzo sobre o crescimento da Missa Tridentina no mundo"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/igreja/2017_09_21_palestra_pozzo/
Online, 21/11/2024 às 09:04:55h