História

Era noite na Espanha
Orlando Fedeli


Cinqüenta anos após a Guerra Civil Espanhola, na qual milhares de sacerdotes e religiosos foram martirizados pelos comunistas por causa da Fé, muita coisa mudou no mundo. Padres e religiosas encabeçam agora as manifestações comunistas. Já não há mártires. Há teólogos da Libertação. O comunismo não mudou sua doutrina, nem seus objetivos. Também não mudou a imprensa, que nos antigos comemorativos da Guerra Civil Espanhola continua a escamotear a verdade.

Era noite na Espanha

O longo crepúsculo da Espanha começou após a morte de Felipe II. Dois séculos depois, a invasão napoleônica instilou no povo espanhol o vírus do liberalismo e deste nasceram o comunismo e o anarquismo.

Os diques da resistência romperam-se em 1931. Nas eleições desse ano, os republicanos obtiveram maioria nos conselhos das grandes cidades embora, no total, tivessem obtido apenas 5875 conselheiros municipais contra 22150 monarquistas. Apesar dessa vitória, o rei Afonso XIII deserdou, renunciando ao trono.

Proclamou-se a república e o novo ministério era composto de maçons, socialistas, ateus e dois católicos complacentes para dar ao governo um ar cristão e democrático. Para aquilatar o que era esse governo basta citar o ministro Alejandro Lerroux, do Partido Radical: "Jovens bárbaros de hoje! Invade e saqueai a decadente civilização desta nação infeliz! Destrui seus templos, liquidai-lhe os deuses, rasgai os véus de suas noviças e elevai- as à condição de mães! Lutai, matai, morrei! "

Não se passaram três meses e começou a perseguição religiosa: em maio de 31, mais de cem igrejas e conventos foram incendiados.

Foi em meio a essas labaredas criminosas que se realizaram as eleições para as Cortes. A esquerda venceu e elaborou uma nova Constituição. A nova carta negava os direitos da Igreja e quis estabelecer a "justiça social" por meio de uma lei agrária. Todas as terras incultas de área superior a 56 acres passavam a ser do Estado que os confiaria a camponeses e a cooperativas.

O ódio à Igreja foi crescendo. Nos quatro meses que precederam a guerra civil houve 160 igrejas incendiadas, 270 assassinatos, 345 greves, 10 jornais empastelados. Era o triunfo da democracia e da liberdade... vermelha.

A guerra civil começou com o caráter de cruzada. Na zona ocupada pelos comunistas e anarquistas correu abundante o sangue dos mártires. Sangue que fez mais para a salvação da Espanha do que as armas.

"Em tempo algum no curso da história da Europa, Talvez mesmo de todo o mundo, viu-se um ódio tão apaixonado à religião e suas obras", são palavras de Hugh Thomas, insuspeito autor da obra A guerra civil espanhola (Ed. Civilização Brasileira, 2vol. 1964).

Barbastro foi a Diocese que apresentou maior porcentagem de vítimas eclesiásticas. De 140 sacerdotes incardinados foram mortos 123, o que significa a eliminação de 87,8% do clero diocesano.

Iniciada a guerra civil, a cidade ficou em poder dos marxistas e grande número de padres e noviços claretianos, beneditinos, esculápios, além do Bispo, foram presos num colégio. Na noite de 1o para 2 de agosto, alguns milicianos apresentaram-se na prisão trazendo um papel no qual se lia: "Vale 20 homens". Uma hora depois, as vinte primeiras vítimas de Barbastro eram fuzilados no cemitério da cidade.

Era comum aplicarem-se torturas aos mártires antes de matá-los: espancamentos brutais, vazamento os olhos, mutilações, queimaduras com cigarros, choques elétricos, e mil outras formas de tormento que o ódio diabólico dos marxistas inventava. Aos Frades de Cernera arrebentaram-lhes os tímpanos enfiando-lhes nos ouvidos contas de rosário. Muitos Padres foram queimados vivos, outros foram enterrados com vida depois de terem sido obrigados a cavar suas sepulturas. A uma senhora, mãe de dois Jesuítas, enfiaram pela boca um crucifixo. Não foram poucos os casos de pessoas atadas a um veículo e arrastadas por ele até morrer.

Ódio à virtude angélica

Inúmeros foram os eclesiásticos e leigos católicos mortos por não querer pecar. Nesses casos a crueldade dos assassinos era ainda maior.

Carlos Bosch Massó de Riudarenas foi aprisionado na noite de 22 para 23 de setembro de 1936 justamente com suas irmãs, uma delas Religiosa dominicana e a outra solteira. Tais foram os horrores praticados com as jovens, que Carlos Bosch pediu para ser morto para não ver o que ocorria. Um bolchevista aproximou-se dele e arrancou-lhe os olhos com um punhal, gracejando: -- "Agora, olharás e não verás".

* * *

O que ocorreu com o irmão coadjutor claretiano Fernando Saperas é digno dos primeiros mártires cristãos. Ele foi preso a 18 de agosto de 1936 por uma patrulha de milicianos de Cervera. Ao exigirem que blasfemasse, confessou ser Religioso. Os algozes resolveram, antes de matá-lo, forçá-lo a pecar. No próprio carro, despiram-no e começaram a pressioná-lo para que consentisse em cometer ações infames. O Religioso resistiu heroicamente. Tentaram primeiro embriagá-lo e não logrando seu intento, conduziram-no a casas de pecado, onde procuraram coagi-lo física e moralmente. As próprias decaídas revoltaram-se com a atitude dos marxistas e os expulsaram. Daí se dirigiram para antros semelhantes. O Irmão Saperas dizia que o matassem mas que jamais pecaria. Essa tortura atroz durou 15 horas. Fernando Saperas finalmente foi conduzido ao cemitério de Tárrega e lá fuzilado, dando vivas a Cristo Rei.

Destruição e Profanações

Em seus paroxismos, o ódio revolucionário revela os intentos que normalmente procura ocultar. No Terror, durante a Revolução Francesa, a fúria anti- religiosa voltou-se contra todos os símbolos do Cristianismo. Entretanto, a revolução comunista na Espanha ultrapassou todos os outros exemplos históricos deste fenômeno.

Em Yunquera de Toledo levou-se a estátua muito venerada de Nossa Senhora de Granada para a Casa do Povo, e quem quisesse inscrever-se na Frente Popular era obrigado, no ato de admissão, a golpear a Virgem.

A uma imagem do Imaculado Coração de Maria deram uma punhalada no coração.

Cerca de mil sacrários foram profanados.

Há uma fotografia das mais simbólicas do espírito revolucionário que presidia a todos esses sacrilégios. Ela mostra um grupo de vermelhos fuzilando a estátua do Sagrado Coração de Jesus no Cerro de Los Angeles.

Uma nota típica da revolução comunista espanhola foi a profanação de cadáveres de Religiosas. Não contentes de torturar e massacrar os vivos, os revolucionários desenterravam os mortos para neles cevar seu ódio a tudo o que era de Deus. Entre outros casos, podemos lembrar que em Barcelona a 20 de julho de 1936 os sequazes de Lenin, depois de invadirem diversos conventos femininos, abriram os sepulcros e expuseram os cadáveres das Religiosas à curiosidade pública, nas portas de suas igrejas. Não se perdoava a virtude nem após a morte.

Faltava ainda um crime

Cinqüenta anos se passaram e com eles muita coisa se esqueceu. Novos crimes, novos ultrajes, novos martírios e sacrilégios praticaram os comunistas em muitas outras terras. Faltava ainda um crime: o da dissimulação. É o seu crime de hoje. E muitos enganados pelas táticas marxistas, afirmam que é preciso dialogar com os que negam toda verdade, todo direito e toda justiça. Hoje os assassinos se apresentam como interlocutores pacíficos, honestos, bem intencionados. Propõe diálogos e acordos. Renunciam, dizem, às violências, a profanar nossas igrejas, nossas imagens, e tudo o que é sagrado para nós. Até nos deixarão viver. Dizem... Em troca pedem apenas que nós mesmos violemos a doutrina católica, que nós mesmos reneguemos a justiça, desistindo do direito de propriedade e da família.

Eles renunciam o sacrilégio. Contanto que nós o cometamos.

Eles nos deixarão as imagens de Jesus Cristo. Contanto que as vistamos, nós mesmos, com as roupagens socialistas. Eles nos deixarão as imagens do Coração de Maria. Contanto que vibremos contra elas nossos punhais de novos iconoclastas.

É a hora de Iscariotes e de Caim. É hora do Príncipe deste mundo. Era noite na Espanha.


    Para citar este texto:
"Era noite na Espanha"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/historia/eranoite/
Online, 21/12/2024 às 17:50:04h