História

Contradições em Coimbra
Marcelo Andrade
     Em toda a Europa, vê-se uma contradição entre todo o patrimônio histórico antigo e as construções modernas. Veem-se também contradições entre muitos turistas que dizem odiar a Monarquia, o Catolicismo e a Idade Média, mas pagam caro para ver as construções das realezas, da Igreja e as medievais.
     A Notre Dame de Paris, por exemplo, é bem mais visitada que a destoante torre de Montparnasse, mas não deveria ser o contrário? Afinal, a primeira é obra da “horrenda” Igreja medieval e a segunda é uma torre alta, tal como um menir gigantesco, e moderna do último quartel do século XX.
     Portugal não foge à regra, há várias contradições. Em Coimbra, destaca-se uma contraposição triste entre a Biblioteca Joanina e algumas “repúblicas estudantis”.
     Na tradicional Universidade de Coimbra, onde um dia os professores juravam defender a fé e a ensinar o tomismo, existe uma das mais belas bibliotecas do mundo, a dita “Joanina”.
     Construída a mando de D. João V, tem paredes de 3 metros de espessura para manter a temperatura constante durante o ano. As madeiras usadas, vindas do Brasil e do Oriente, foram escolhidas de modo a controlar a umidade do local.
     Há morcegos que durante o dia permanecem escondidos e que durante a noite saem e fazem “serviço de limpeza” contra insetos, por causa disto não é necessário usar inseticidas contra traças e outros bichinhos que danificam os livros.
 

 Fig.1 - Biblioteca da Universidade de Coimbra: beleza que impõe respeito.

 

     Uma biblioteca é um local destinado à guarda de livros, normalmente, de forma organizada. A Joanina, além de cumprir esse objetivo, é também bela e, assim, além de estocar o saber, ensina pelo simbolismo. Ressaltemos alguns desses pontos:

1) Contraste entre o exterior simples e o interior rico, como é comum no barroco, que ensina que a boa riqueza é a interior.

2) Organização e hierarquia, pois todo o conhecimento tem de estar organizado, na mente como na biblioteca, com uma adequada hierarquia das matérias.

3) Proporção. Em toda a biblioteca há proporção: entre a altura, o comprimento, a largura e em toda a decoração. Digamos que ela também é proporcional, analogicamente, à Suma Teológica e a Os Lusíadas.

4) Decoração. Bem detalhada, simbolizando a ramificação e detalhamento que deve ter todo conhecimento, varrendo os vários campos não apenas de modo vago, mas com detalhado aprofundamento. Muitos dos temas decorativos remetem aos temas de estudo, fazendo uma bela ponte entre o aspecto simbólico e aquilo que se aprende pelos livros.

5) Beleza. Não existe verdade sem beleza nem beleza sem verdade. E, a biblioteca, busca a beleza em todo o seu conjunto, ao contrário das bibliotecas modernas que visam apenas à praticidade.

6) Solenidade. O conhecimento é apresentado como algo sério e digno de muita consideração.

7) Silêncio. A meditação e o estudo são incompatíveis com o barulho do mundo

8) Perpetuidade. Por ser rica e sólida, não foi construída para pouco tempo, mas para sempre. Todo o conhecimento tem de ser passado para as gerações futuras.

9) O quadro de D. João V existe para ensinar o valor da Monarquia, que no caso de Portugal, forjou a boa alma da Nação.

10) Como último ponto de nossa análise, podemos dizer que ela é um Trivium arquitetônico, porque a Biblioteca visa ao conhecimento, com regras e de modo esteticamente elevado.

     Se ela não tem mais o valor prático que outrora teve, porque as obras outrora encontráveis apenas nas bibliotecas podem agora ser encontradas na Internet e em outros lugares, o simbolismo e a história não a deixam perder o posto de uma biblioteca majestosa.

Fig.2 - Riqueza e solenidade.

     Próximas da Universidade de Coimbra, existem as famigeradas “repúblicas estudantis”, que são moradas de alunos. Originalmente estas moradias foram criadas pelo rei Dom Dinis. Que contradição! São chamadas de “repúblicas”, mas foram criadas pela Monarquia.
     Nas ruas onde elas se encontram, lamentavelmente, veem-se pichações escarrando chavões comunistóides e “relinchos” modernistas.
 

 Fig.3 - Uma “república” de Coimbra

 

1) Vemos apenas o exterior. Se na biblioteca, a beleza e a inteligência são internas, nas repúblicas, a ignorância e a feiura são externas. Não contente em se pensar erradamente (pelo cartaz visível) quer-se que todos saibam disto.  Deduzimos que o interior seja similar ao exterior.

2) Desproporção entre as faixas e lençóis.

3) Feiura explícita.

4) Não visa ao conhecimento, mas a papagaiar “slogans” que são conclusões sem premissas.

5) Desorganização das ideias, pois nestes dizeres: “contra a hierarquia e o autoritarismo”, os pobres estudantes não percebem a contraposição, posto que já hierarquizaram, sem querer, colocando em destaque este dizer e não outro.  E ao colocar a faixa de modo impositivo sem argumentação, já manifestaram algo de autoritarismo.

6) Paixão do momento. Obviamente, os cartazes não são feitos para durar muito nem na fachada, e, esperamos, nem na mente dos alunos.

 

     Pobres estudantes que não aprenderam a lição da biblioteca da Universidade onde estudam! E não precisaria ler nenhum livro dela, o simbolismo da biblioteca já de per si ensina, como se fosse um alfarrábio.

     A comunicação visual era feita desde a Grécia Antiga, com apogeu na Idade Média, com o objetivo de ensinar por meio de símbolos pictóricos os analfabetos.

     O séc. XX e o XXI parecem que padecem de duplo analfabetismo...

     Mas, sejamos justos, o nome “república” combina, pois assim como as repúblicas emporcalharam a vida das nações, as estudantis parecem fazer o mesmo em relação à Universidade. Se Portugal tivesse sido uma República na época das navegações, talvez nem tivesse conseguido passar por Gibraltar, quanto mais por Taprobana.

     Pobre República que fez as repúblicas.

     Viva a Monarquia católica que fez a Biblioteca.

São Paulo, 13 de janeiro de 2017 


    Para citar este texto:
"Contradições em Coimbra"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/historia/contradicoes_em_coim/
Online, 21/11/2024 às 09:05:32h