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Dúvidas sobre Santo Agostinho: Gnose e Predestinação
PERGUNTA
De Gustavo, aquele que a quem Chamam de Agostiniano Severo, Saudações da parte de nosso Senhor Jesus Cristo!
Gostaria de pedir humildemente que refutassem algumas mentiras que tantos protestantes e Esotéricos erroneamente atribuem a Santo Agostinho, a acusação de que Santo Agostinho seria Gnóstico, que defendeu uma mentira gnóstica e que Pelágio seria o ""verdadeiro herói "" da fé contra um homem rude (ou como dizem as palavras da língua de Natan Rufino que Pelágio era homem temente a Deus e Santo Agostinho, um covarde). E além disso, gostaria de adicionar um bônus, e se possível, gostaria que usassem algumas citações, sei que Santo Agostinho nunca defendeu a Dupla predestinação, nem a expiação limitada e nenhuma outra mentira calvinista, mas poderia demonstrar isso através das citações dele?.
Atenciosamente, Gustavo Agostiniano Severo.
RESPOSTA
Salve Maria!
Atendendo a sua solicitação, refutaremos com prazer as frágeis mentiras dos hereges contra Santo Agostinho.
Nesse intuito, recorreremos aos próprios escritos do Bispo de Hipona, suficientes para derrubar a propaganda herética.
Começaremos pelo rótulo de gnóstico, algo absurdamente insustentável!
É verdade que Agostinho pertenceu, antes da sua conversão, à seita dos maniqueus. A propósito, esse fato é reconhecido pelo próprio Doutor da Graça:
“Acreditei nos erros dos maniqueístas” (Sto. Agostinho. Confissões, Livro III, 6).
Por essa sincera e humilde declaração, nota-se o arrependimento e a mudança de pensamento.
Bem sabemos, caríssimo Gustavo, que a doutrina do maniqueísmo era gnóstica. Eles acreditavam na existência de dois princípios. Um deles seria bom (a divindade), enquanto o outro seria mau (o diabo), criador da matéria perversa. Nesse sentido, o mal seria uma substância, e não uma privação de bem, como bem argumentou Santo agostinho contra a gnose dos Maniqueus.
Para explicitar o pensamento antignóstico de Santo Agostinho, reproduzirei as suas próprias Confissões.
Enquanto os maniqueus ensinavam que a matéria era obra do Diabo, Santo Agostinho ensinava o contrário, refutando as mentiras da seita gnóstica:
“Mas, ó Senhor Nosso – ó Deus verdadeiro que criastes não só as nossas almas mas também os nossos corpos, e não só as nossas almas e corpo, mas ainda todos os seres e todas as coisas...” (Confissões, Livro VII, 3).
Conforme supradito, o maniqueísmo concebia o mal como substância. Ora, Santo Agostinho, combatendo esse erro gnóstico grosseiro, dirá o contrário em suas Confissões:
“Portanto, todas as coisas que existem são boas, e aquele mal que eu procurava não é uma substância, pois se fosse substância, seria um bem. Na verdade, ou seria substância incorruptível, e então seria certamente um grande bem, ou seria substância corruptível, e, nesse caso, se não fosse boa, não se poderia corromper” (Confissões, Livro VII, 12).
Para encerrar essa primeira questão, transcrevo mais um ataque direto de S. Agostinho contra a gnose maniqueísta:
“Desapareçam, ó meu Deus, da vossa face, como vãos faladores e sedutores do espírito, os que, ao observarem a deliberação das duas vontades, afirmam que temos duas almas de duas naturezas diferentes: uma boa e outra má. Ora, esses tais são realmente maus, ao seguirem essa má doutrina” (Confissões, Livro VIII, 10).
Provado que Santo Agostinho condenou o gnosticismo, passemos a questão da predestinação.
Antes de expor a pensamento agostiniano, permita-me reproduzir o ensinamento tradicional da Igreja, no que diz respeito a predestinação para a perdição, conforme sustentou a heresia calvinista. Para tanto, cito a declaração do Concílio de Orange:
“Não somente nós não cremos que alguns homens sejam predestinados para o mal pelo poder divino, mas, se há espíritos que desejam acreditar em tão grande mal, nós lhes lançaremos o anátema com indignação” (Denzinger 200, 397).
O infalível Concílio de Trento reafirma essa declaração:
“O pecado não vem de Deus, pois são os próprios homens que tornam más as suas vias” (Sessão VI, can. 6).
O teólogo Dominicano, Padre Édouard Hugon, explica a doutrina católica sobre a predestinação:
“Na predestinação Deus decide auxiliar os eleitos a se salvarem. Na reprovação muito longe de querer ajudar os maus a se perderem, consente em lhes conceder todos os socorros necessários ao cumprimento do dever, e ainda se ocupa delas pela sua Providência comum e mesmo pela sua Providência sobrenatural geral, de modo que se eles se perdem, não é porque se lhes foi impossível serem bons, mas porque rejeitaram sê-los” (Pe. Édouard Higon, O. P. Os Princípios da Filosofia de Santo Tomás. PR: Calvarie Editorial, 2022, p. 277).
Posto isso, cabe demonstrar – atendendo também a sua solicitação – que Santo Agostinho defendeu o livre arbítrio, não sustentando que certas almas são destinadas por Deus, desde o princípio, à eterna perdição.
Discorrendo sobre a Graça e a Liberdade, ensinou o Santo Doutor:
“Em segundo lugar, como escreve o apóstolo Paulo, Deus julgará o mundo (Rm 3, 6 ), quando vier para julgar os vivos e os mortos, como a Igreja Católica professa no Símbolo. Portanto, se não existe a graça de Deus, como há de salvar o mundo? E se não existe a liberdade, como há de julgar o mundo?” (Santo Agostinho. A Graça e a Liberdade, Carta 194, 2).
E que Deus não é causa do pecado, asseverou o Santo Doutor:
“Portanto, ninguém reclame de Deus, mas considere-se culpado quando peca” (Santo Agostinho. A Graça e a Liberdade, Carta 195, Cap. II, 4
No Escrito A Verdadeira Religião, Santo Agostinho ressalta que o pecado não é um decreto divino, mas um ato da livre vontade do homem:
“E ao que se refere a tentação do primeiro homem por um anjo mau, não faltou aí o livre consentimento da vontade. Se ele houvesse pecado por constrangimento, não teria sido réu de delito” (Capítulo XIV, 28).
No escrito sobre O Livre Arbítrio, Santo Agostinho declara de modo inequívoco:
“Se duvidas, reflete no que já dissemos acima: as más ações são punidas pela justiça de Deus. Ora, elas não seriam punidas com justiça, se não tivessem sido praticadas de modo voluntário” (Livro I, Cap. I, 1).
Respondendo por qual motivo agimos mal, responde novamente o Santo de Hipona:
“Deus não é o autor do pecado” (Livro I, Cap. II, 4).
E conclui convictamente:
“Logo, não se pode imputar justamente o pecado a não ser a quem seja dono da vontade. Ou, afinal, a vontade não será mais a causa do pecado e, assim, não haverá mais pecado algum” (Livro III, Cap. XVII, 49).
Por essas declarações, inconfundíveis, se percebe, caríssimo Gustavo, que Santo Agostinho não defendia a absurda doutrina Calvinista. Leia-se todas as obras do Santo, e verá como o livre arbítrio resplandece na doutrina agostiniana.
Por fim, diremos algo sobre Pelágio.
Segundo sua descrição, existe uma alcateia que pretende difamar Agostinho e exaltar um herege dissimulado.
Primeira observação: Pelágio foi devidamente refutado por Sto. Agostinho, que desmascarou todos os seus subterfúgios (Cf. Santo Afonso de Ligório. História das Heresias e suas Refutações. São Paulo: Ecclesiae, 2020, p. 123-124).
Segunda Observação: Santo Agostinho não foi o único a combater Pelágio. Junto com o Doutor de Hipona, outro Doutor se levantou contra o heresiarca, a saber, São Jerônimo:
“Ao mesmo tempo, São Jerônimo, ao saber daquela carta de Pelágio, escreveu à mencionada virgem que evitasse a doutrina de Pelágio; e então começou a combater a heresia dele com muitos livros e, em especial, com aquele dos Diálogos de Ático e Critóbulo” (op. cit., p. 126).
Além disso, sofreu Pelágio a condenação dos Papas e dos Concílios, que rechaçaram a doutrina pelagiana:
“No ano de 417, o Papa Santo Inocêncio respondeu, e na resposta às duas cartas sinodais confirmou a doutrina católica sustentada nos dois mencionados Concílios (Cartago e Milevi) acerca da graça e condenou Pelágio e Celéstio com todos os seguidores, declarando-os excluídos da Comunhão da Igreja” (op. cit., p. 128).
Também o Papa São Zózimo, juntamente com o Concílio de Cartago (composto por 214 bispos), endossou as condenações anteriores:
“Informados de tudo e tendo recebido a carta do Papa, os bispos da África celebraram um concílio em Cartago, composto de duzentos e quatorze bispos, e escreveram a Zózimo expondo-lhe as razões que eles tinham para julgar Pelágio e Celéstio hereges pertinazes e hábeis em se fingir ortodoxos, posto que aferrados aos seus erros. O Papa sujeitou então Celéstio a uma inquirição mais rigorosa; e, depois de ter se convencido, pela leitura de um livro de Pelágio, de que este heresiarca havia sido bem julgado pelos bispos da África, proferiu, em 418, uma sentença que confirmava tudo quanto se tinha feito contra os pelagianos e que foi recebida com respeito por todo o mundo católico” (Padre Rivaux. Tratado de História Eclesiástica. Brasília: Editora Pinus, 2011, p. 390).
Tão “virtuoso” era o herege Pelágio – mentiroso e dissimulado – que, além de sofrer as condenações dos Papas, Bispos, Concílios, e até do Imperador Honório, foi banido de Roma e da Palestina:
“Pelágio, depois de ser condenado pelo papa Zósimo e depois de ser banido de Roma, em seguida, pelo Imperador Honório, se retirou na sua amada Palestina, que antes o havia acolhido; mas como também ali deixara evidentes demais as suas impiedades e simulações, também de lá foi expulso” (Santo Afonso de Ligório. História das Heresias e suas Refutações. São Paulo: Ecclesiae, 2020, p. 129).
Pelo exposto, fica provado que Agostinho era Santo e Pelágio uma cobra herética, justamente condenada!
Espero tê-lo ajudado!
Eder Moreira