Política e Sociedade

Igreja progressista no limite entre desistir ou lutar pelo PT
PERGUNTA
Nome:
Gustavo
Enviada em:
12/08/2005
Local:
Timoteo - MG,
Religião:
Católica
Escolaridade:
Superior em andamento



Igreja progressista no limite entre desistir ou lutar pelo PT


Aliado histórico do PT, setor progressista da Igreja Católica enfrenta seus próprios dilemas frente à crise do governo e do partido. Enquanto recente encontro das Comunidades Eclesiais de Base faz críticas duras mas mantém um apoio ao “projeto petista” para o país, lideranças de pastorais sociais defendem rompimento.

Verena Glass - Carta Maior 26/07/2005

São Paulo - O recente encontro das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) em Minas Gerais, que terminou no último sábado (23), retratou, de certo modo, a difícil situação em que a crise do governo e do PT deixou um dos mais fortes e antigos aliados do partido: o setor progressista da Igreja Católica.

Na última semana, adiantando-se a prováveis críticas, o presidente Lula enviou aos cerca de 300 participantes do 11o Intereclesial das CEBs uma carta em que afirma que, reconhecendo a importância do “papel que as CEBs desempenharam na resistência à ditadura militar (...), no apoio ao Movimento Sindical e na formação dos partidos de esquerda, em particular o PT (...), não quero esconder de vocês o sofrimento que estamos vivendo nestes dias; sofrimento agudo porque lida com um dos pilares mais importantes de nossa vida militante e política, que é a ética”.

Negando que a crise seria “o fim do nosso Partido, assim como erra quem afirma que nosso Governo acabou ou não tem saída”, Lula enfatizou que ainda tem a preocupação de realizar as “mudanças propostas”, garantindo que, enquanto pessoa, “é a mesma mente que um dia se comprometeu com os pobres, com os excluídos deste País, que vai continuar lutando pelos mesmos ideais, pelas mesmas causas”.

A estratégia de Lula quase deu certo. Num primeiro momento, levou à redação de um documento que afirmava apoio incondicional das CEBs à sua pessoa, mas a condução contraditória do governo (dois dias depois do envio da carta, Lula concretizou a demissão de Olívio Dutra, quadro histórico do partido, e entregou o Ministério das Cidades ao PP) acabou levando a um endurecimento do posicionamento.

“Foi um processo de escrever, reescrever e discutir longamente o documento final do evento, mas o que acabou saindo foi um apoio ao projeto original [do PT] de transformação do Brasil, com duras críticas à corrupção, à política econômica, que subordina nosso país ao capital financeiro, e às alianças com partidos que não têm decência, que votam se se paga. Sobre o PT, a sensação mais geral foi que é um partido que as CEBs construíram e não vão entregar assim, mesmo porque é muito difícil construir outro. Veja bem, esta não foi uma pauta do encontro, mas as CEBs são o setor mais popular da Igreja, e cerca de um terço dos presentes eram filiados ao PT. Acho que é uma boa amostragem. O que se sentiu, em resumo, foi uma enorme perplexidade com aos fatos, a corrupção e os rumos do governo, mas no fundo uma rejeição em abandonar Lula e o PT”, explica o padre José Oscar Beozzo, coordenador do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (Cesep) de São Paulo.

PT de quem?

Entre lutar pelo partido e aceitar a hipótese da impossibilidade de recuperar seu projeto histórico, no entanto, outros setores da Igreja, como a Pastoral do Migrante e a Pastoral Operária (PO), são menos otimistas. A avaliação é que o governo Lula teria capitulado e aderido ao projeto neoliberal, firmando um novo compromisso, desta vez com o capital e o mercado financeiro, explica Waldemar Rossi, membro da coordenação da PO de São Paulo.

“A PO nasceu na luta operária e é compreensível que seja a mais decepcionada com Lula e o PT nesse momento. A decepção vem desde a composição do governo com partidos de direita e o fortalecimento do núcleo duro do PT, e neste momento o sentimento da maioria da PO e de boa parte das pastorais é que, depois de pedir apoio e confiança, o partido e o governo deram as costas ao movimento social. Nem na crise o governo ouve as organizações”, diz Rossi.

O afastamento de parte das bases das pastorais do PT e a “desistência” do governo, apesar de cada vez mais consolidados, no entanto ainda não são finais. Com um fio de esperança de que o Processo de Eleições Diretas do PT (PED) possa modificar a correlação interna de forças do partido e que, caso a esquerda saia fortalecida, algo mude, posterga para o fim do ano um rompimento definitivo.

A expectativa, expressa repetidamente por vários membros da Igreja, é que ocorra um delineamento mais claro do quadro geral nos próximos meses, mas, segundo Rossi, a tendência de que muita gente saia do PT e se junte ao PSOL vem se fortalecendo dentro e fora de setores da Igreja. “Acho que ainda não existe uma alternativa para disputar o poder, particularmente não penso em me ligar ao PSOL, mas muita gente deve fazer isso ao final do PED”, afirma Rossi.

Assim na cúpula, como na base

Entre as maiores referências progressistas da cúpula da Igreja, apesar de a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) não ter se pronunciado oficialmente sobre a crise, as avaliações sobre o PT e o governo não são das melhores.

Em entrevista ao jornal Diário de São Paulo no último domingo, o arcebispo emérito de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns, afirmou que está decepcionado e que a Igreja se sente traída pelo governo por ter ignorado o projeto social que havia sido construído conjuntamente. Também disse acreditar que Lula teve conhecimento dos fatos que levaram à crise. “Até a poucos dias, nós achávamos que ele não sabia. Mas depois que ele disse que todos os partidos costumam ter essa mesma prática, naquela hora nós ficamos inteiramente convencidos de que o Lula sabe da coisa e não toma as iniciativas que deve tomar”, disse Arns ao Diário.

Já o bispo de Jales, Dom Demétrio Valetini, avalia que o PT começou a dar mostras de que estava mudando ainda antes das eleições, quando retirou a legenda da campanha contra a ALCA sob o argumento de que permanecer poderia afastar certos setores e prejudicar as eleições, e quando iniciou as discussões de alianças com os partidos conservadores.

“O governo se reduziu a um mero administradosr do pagamento da dívida, desde o início Lula optou por não romper com essa política econômica; nós nos enganamos. A direita apoiou Lula porque ele estava comprometido com esse modelo econômico, e para que neutralizasse a esquerda. Vale a pena apostar em Lula se ele se coloca como instrumento destas políticas, se se limita a ser isso? As esquerdas que querem propor mudanças, por que se enganar com Lula? Essas ainda são perguntas. Quando se tornarem constatações, acabam-se as ilusões”, desabafa Valentini.

Para o bispo, porém, ainda é uma incógnita se hoje se apresenta alguma alternativa política ao PT. O perigo, avalia, é que a crise favoreça oportunistas como o ex-governador do Rio, Antony Garotinho (PMDB-RJ). “Heloisa Helena, Eduardo Suplicy, poderiam ser líderes? Não sei. Mas não adianta agora sonhar com transformações radicais. A crise é congênita à nossa história política de corrupção, é a manifestação da mentalidade de que, quando se está perto do poder, há que se apoderar dele. Concretamente, para acabar com a corrupção, proporia acabar com a reeleição, regulamentar a consulta popular como instrumento democrático e aglutinação da cidadania, exigir a fidelidade partidária, limitar a propaganda eleitoral, restringir as emendas parlamentares”.

Para Dom Tomas Balduíno, ex-bispo de Goiás e coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT), na raiz de tudo está a transformação da democracia em crime organizado, um poder paralelo cuja mola impulsora é o dinheiro. “É o dinheiro pra campanha, pra corrupção... O processo democrático hoje funciona com algo que o povo não tem: muito dinheiro. O pior é que as pessoas julgam legal esse desvio de função, de recursos. E o PT deixou se vender, se rendeu ao sistema”.

Por outro lado, avalia Dom Tomas, o que se vê agora é uma “inquisição onde os inquisidores estão à cata de questões morais sem ter moralidade, e onde o que importa é apenas o réu. Não se discute as mazelas do povo. Mas na raiz de tudo, na raiz do sistema corrupto onde a democracia é objeto de compra e venda, está o modelo econômico, que infelizmente não vai sofrer nenhum arranhão”.

Se o PT ainda é um caminho? O PT, avalia Dom Tomas, não é mais uma representação do povo junto ao governo. Segundo ele, seria possível juntar os cacos do partido “porque há clamor do povo”, e não se joga no lixo quase trinta anos de trabalho e luta. “É preciso mobilizar o povo, o tempo urge e a realidade política não espera”. Como fazer isso, porém, para esta pergunta, não tem resposta.

fonte: http://agenciacartamaior.uol.com.br/agencia.asp?id=3309&cd_editoria=001&coluna=reportagens


Gustavo Henrique

RESPOSTA

Muito prezado Gustavo,
Salve Maria!
 
Tenho que lhe agradecer muito essas informações que não saíram na grande imprensa. Deus lhe pague. Essas informações serão extremamente úteis, pois esclarecem muito o que está acontecendo na CNBB e nas CEBs.
 
Tudo o que você souber sobre o encontro das CEBs, em Ipatinga, será importante. Peço-lhe principalmente posicionamentos das CEBs e dos Bispos sobre Bento XVI e o próximo Sínodo dos Bispos, em Roma.
 
In Corde Jesu, semper,
Orlando Fedeli