Polêmicas

Vaticano II: um concílio pastoral
PERGUNTA
Nome:
César
Enviada em:
26/10/2000

Coloquei a questão sobre o Concílio Vaticano II numa lista de discussão porque li na Mofort que ele não é dogmático e alguém mandou esta resposta.
Gostaria de saber sua opinião.
Obrigado.
César

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Esta tese é defendida pela ala ultra radical e conservadora da Igreja, especialmente os seguidores da TFP (Tradição Familia e Propriedade) que não está em plena comunhão com a Igreja, o ex-bispo Lefreve (excomungado "latae sententiae") e o bispo de Campos, no Rio de Janeiro.
O Concílio não foi dogmático quanto a debelar alguma heresia grave, pois, graças a Deus não havia; portanto ele foi mais pastoral mesmo. Mas, o Concílio se pronunciou de maneira dogmática em três documentos:
Constituição Dogmática Dei Verbum - sobre a Revelação divina
Constituição Dogmática Lumen Gentium - sobre a Igreja
Constituição Dogmática Sacrossantum Concilium - sobre a Liturgia
Por que a expressão "Dogmática" empregada pelo Concílio, se não fosse assim?
Na verdade, os "inconformados", que acham que sabem mais do que a própria Igreja e o Papa, procuram brechas para negar a infalibilidade do Concilio junto com o Papa. São desobedientes e maus católicos.
Note que o Papa Paulo VI, pessoalmente, aprovou TODOS os 16 documentos do Concílio, com a segunte forma que aparece no final de TODOS os documento:
"E nós, pela Autoridade Apostólica por Cristo a Nós confiada, juntamente com os Veneráveis Padres, no Espírito Santo, o APROVAMOS, DECRETAMOS E ESTATUÍMOS. Ainda ordenamos que o que assim foi determinado em Concílio seja promulgado para a glória de Deus". Roma, junto a São Pedro, no dia 7 de dezembro de 1965 (No caso da Lumen Gentium)
Ora, o Papa só usa essas expressões Aprovamos, Decretamos e Estatuímos, quando se trata de palavra oficial da Igreja e portanto obrigatória a todos os católicos. Ou será que o Papa e o Concílio estavam brincando?
Não se deixe levar por essas vozes que não são as da Igreja. O nosso Papa ama, de todo o coração, o Concílio.
Felipe de Aquino

RESPOSTA


Muito prezado César, Salve Maria.

A questão que você coloca não é de opinião. Trata-se de saber qual a autoridade teológica das decisões do Concílio Vaticano II.

Sobre isso, o próprio Papa Paulo VI decidiu a questão, tratando explicitamente do tema, em seu discurso de encerramento do Concílio Vaticano II.
Disse o Papa Paulo VI , nesse discurso:

"Há quem se pergunte que autoridade, que qualificação teológica o Concílio quis atribuir aos seus ensinamentos, pois bem se sabe que ele evitou dar solenes definições dogmáticas envolventes da infalibilidade do Magistério Eclesiástico. A resposta é conhecida, se nos lembrarmos da declaração conciliar de 6 de Março de 1964, confirmada a 16 de Novembro desse mesmo ano: dado o caráter pastoral do Concílio, evitou este proclamar em forma extraordinária dogmas dotados da nota de infalibilidade. Todavia, conferiu a seus ensinamentos a autoridade do supremo Magistério ordinário" (Paulo VI, Discurso no encerramento do Concílio, 12 - I 1966. Apud Compêndio do Vaticano II, Editora Vozes, Petrópolis, 1969, pg. 31).

Está aí, meu caro César: é o próprio Paulo VI declarando que o Vaticano II não se arrogou valor dogmático infalível.
Portanto, foi falível. Merece respeito. Mas não exige adesão de fé, porque foi só pastoral. O Vaticano II não formulou nenhum dogma.

Aliás, o Cardeal Ratzinger tem condenado aqueles que querem transformar o Vaticano II, de Concílio Pastoral, em super dogmático, como se ele fosse o único Concilio que se deve aceitar.

Argumenta a pessoa que escreveu o texto que você me mandou que o Vaticano II fez várias "Constituições dogmáticas", e daí o autor que você cita conclui erradamente que, sendo por exemplo a Lumen Gentium uma constituição dogmática, ela teria autoridade dogmática.
Esse é um erro ingênuo.

A Constiutição trata de um tema dogmático, mas não foi promulgada dogmaticamente, como dogma.
Qualquer professor de seminário, pode dar uma aula sobre tema dogmático. Mas ele não dá uma aula com autoridade dogmática.
O fato de a Lumen Gentium, repito, tratar de um tema dogmático, não significa que ela contenha dogmas, pois foi tratada e publicada pastoralmente, e não dogmaticamente.

O Concílio Vaticano II foi um Concílio Pastoral e não dogmático. Sua autoridade é grande, mas não infalível.
O Papa João XXIII, ao convocá-lo, salientou esse aspecto pastoral do Vaticano II. O Papa Paulo VI, ao encerrá-lo, sublinhou extamente a idéia de que ele não fora um Concílio dogmático, e portanto que não era infalível.
Esta não é a explicação adotada apenas por movimentos tão cheios de erros como os citados no texto que você me mandou.
É a explicação do próprio Cardeal Ratzinger. É a posição oficial da Igreja, determinada por Paulo VI.

O autor do texto cai noutro erro grave ao dizer que naquele tempo "não havia heresias".
Ora, na década de 60 a mais grave heresia da História ameaçava dominar todo o mundo: o marxismo. E o Concílio recusou tratar do tema. Até foi proibido citar a palavra Comunismo, ou URSS, na sala Conciliar.
E havia a heresia --como há até hoje -- modernista. Como haviam graves erros doutrinários na Moral, na Liturgia etc.
Dizer que no século XX não haviam heresias é desconhecer totalmente a História dessa época e o que é heresia.

Quanto às fórmulas de aprovação dos documentos conciliares, elas são fórmulas de praxe, que não dão caráter dogmático aos textos aprovados.
Para que seja aprovado algo dogmaticamente, com obrigação absoluta de crer, é preciso que o Papa declare que está aprovando algo sobre Fé ou Moral, para toda a Igreja, com o poder dado por Cristo a Pedro e a seus sucessores, definindo isso como obrigatório, e excomungando a tese oposta.
No Vaticano II, nada foi aprovado assim solenemente. Por isso o Vaticano II não publicou anatematismos, que são a condenação de dizer o contrário do que foi aprovado.

Ainda neste mês, na Folha de São Paulo, o ex frei Boff publicou um artigo provando que a Dominus Iesus vai contra o texto do Concílio. Estariam o Papa João Paulo II e o Cardeal Ratzinger em heresia por contrariarem o Vaticano II na Dominus Iesus?
Isso é um absurdo,

In Corde Iesu, semper,
Orlando Fedeli